TRABALHO
O mal que se repete
Entre as doenças relacionadas ao trabalho, as Lesões por Esforços Repetitivos (LERs) estão em maior evidência e atingem as mais diversas categorias profissionais como pedreiro, cabeleireiros, costureira, digitadores, bancários, dentistas. Considerada epidêmica pela OMS, a lesão pode limitar para o trabalho quando diagnosticada em fase avançadaO mal que se repete
Fátima Guimarães - da Redação
Jornada de trabalho exaustiva em funções com limitadas variações de movimentos, execução de tarefa em rápida freqüência, com uso de força, aliada ao ambiente físico inadequado, má postura, pressão das chefias, estresse. Esse conjunto de fatores aumenta os riscos das Lesões por Esforços Repetitivos (LERs) ou Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho (DORT). Quando não tratadas precocemente, as lesões podem causar limitações para o trabalho, gerando problemas sociais e psicológicos. Para o 1º de Maio, Dia do Trabalho, a recomendação da Organização Mundial da Saúde (OMS) e Organização Internacional do Trabalho (OIT) está voltada para o respeito à saúde e os direitos dos trabalhadores.
Segundo a OMS, a LER/DORT é a doença ocupacional em maior evidência no mundo e considera a situação epidêmica. Essas lesões são um conjunto de doenças de origem ocupacional que podem acometer tendões, músculos, nervos e ligamentos, que atingem os membros superiores e inferiores. A médica do trabalho Inês Bezerra de Figueiredo diz que a LER está presente em diversas categorias profissionais como costureira, estivadores, bancários, dentistas, cabeleireiros. Dos 800 cadastrados no Núcleo de Reabilitação Profissional da Gerência Executiva Fortaleza do INSS, 15% são por LER.
De acordo com dados do Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS/Dataprev), em 2003 foram registradas 21.208 doenças do trabalho, 1.103 a mais que no ano anterior. No caso da LER/DORT tem como principais sintomas fadiga muscular, sensação de peso e cansaço no membro afetado, formigamentos, dormência, inchaço, perda da força muscular. Embora seja causa freqüente de afastamento ao trabalho, é de difícil diagnóstico e nem sempre os médicos relacionam as lesões à atividade exercida pelo paciente. Regina Nobre, médica do trabalho, ressalta que os profissionais de saúde têm de despertar para as doenças ocupacionais e, durante o atendimento, perguntar sobre as condições em que o indivíduo trabalha, a execução das tarefas e sua complexidade.
Para manter o emprego, muitos trabalhadores ultrapassam seus limites, escondem o problema e retardam a procura ao médico. Estudos mostram que indivíduos que têm jornada exaustiva, trabalham sob pressão dos chefes, tensão psicológica e estresse adoecem mais de LER/DORT quando comparados aos que atuam em condições contrárias. Mauro Fuziki, ortopedista e médico do esporte, explica que as medidas preventivas incluem um conjunto de ações por parte do empregador e empregado. No entanto, ele ressalta que é fundamental tratar as lesões no início.
"Doutor vou ficar curado?". O ortopedista diz que essa é a primeira pergunta que o paciente faz. Fuziki acrescenta que as pessoas chegam sem acreditar na eficácia do tratamento e que em muitos casos isso se deve à falta de informação. O médico acrescenta que em mais de 80% dos casos o tratamento é bem sucedido, principalmente, se o diagnóstico é feito na fase inicial e a doença tratada corretamente. O restante, em torno de 20%, evolui para a forma crônica em decorrência do estágio avançado da lesão. Quando isso ocorre, a maior parte dos doentes fica com seqüelas.
O tratamento geralmente é à base de anti-inflamatórios, relaxantes musculares, fisioterapia e reabilitação. Nos casos mais severos pode ser indicada cirurgia. Para o especialista, a fisioterapia é muito importante porque vai trabalhar mecanicamente no órgão que está sofrendo a pressão.
Segundo ele, a pessoa que tem bom condicionamento físico suporta melhor a carga de trabalho e corre menos risco de sofrer lesões. Neste caso, é indicado um programa de exercícios físicos para preparar o organismo para receber mais uma atividade laboral. Fuziki lembra que algumas atitudes individuais, como a postura inadequada, maneira de levantar um peso, também interferem na saúde. Ele acrescenta ainda que as empresas têm de investir na saúde do trabalhador, propiciando condições físicas adequadas para o desempenho das funções, oferecer programa de ginástica laboral, palestras educativas.
FIQUE DE OLHO
LER/DORT
As Lesões por Esforço Repetitivos (LERs) ou Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho (DORTs) são doenças do trabalho provocadas pelo uso inadequado e excessivo do sistema que agrupa os ossos, nervos, músculos e tendões. O problema atinge, principalmente, os membros superiores como punho, braço, ante-braço, ombro e coluna cervical.
As Lesões são causadas por diversos tipos de pressão existentes no trabalho, que atacam as pessoas tanto física quanto psicológicamente.
O problema pode acontecer quando o indivíduo executa uma atividade mecânica por um longo período de tempo, seja no trabalho ou em casa.
A LER/DORT é uma modalidade de acidente de trabalho denominada "doença ocupacional".
Movimentos que podem provocar lesões
- Levantar, erguer objetos, perfurar ou martelar
- Empurrar ou puxar, apertar, espremer, torcer
- Movimentar muito dedos ou punhos
LESÕES MAIS COMUNS
Tendinite: Uso constante de punhos, cotovelos e ombros podem causar pequenos rompimentos nos tendões que ficam inchados, inflamados e dolorosos. A dor é mais à noite. O tratamento varia de acordo com a causa e a intensidade da lesão.
Vista cansada: É um resultado do trabalho por período prolongado com tela de vídeo, computador
Dor lombar: Está geralmente relacionada à má postura ou com levantamento inadequado de objetos ocasionando a Síndrome do Túnel do Corpo, que ocorre quando os tecidos que passam dentro do túnel (túnel estreito localizado nas partes por onde passam os tendões), incham, comprimindo os nervos. O diagnóstico precoce reduz o risco de seqüelas e é mais facilmente tratado com fisioterapia e uso de antiinflamatório.
Sintomas: Fadiga muscular, Sensação de peso e cansaço no membro afetado, Dores, Formigamentos, Inchaço, Dormência, Perda da força muscular e dos reflexos, Calos localizados.
Diagnóstico - Basicamente por meio de exame clínico. A dor é a principal queixa.
O que fazer - Procurar um médico a fim de fazer o diagnóstico. Quanto mais cedo for iniciado o tratamento, melhor o resultado. Nos casos avançados, aumentam as chances de limitações física.
O que as empresas podem fazer para ajudar
- Emitir à Comunicação de Acidente de Trabalho quando houver suspeita da doença
- Desenvolver Programa de Controle Médico e Saúde Ocupacional, previsto pela Norma Regulamentadora número 7
- Alertar os trabalhadores quanto aos sintomas, incentivando-os a prestar atenção em suas limitações, orientando-os a buscar auxílio médico imediato
- Ter atitude de amparo ao trabalhador com LER/DORT, tanto em relação ao tratamento como à reabilitação
- Ter política de prevenção para que se evite o adoecimento
- Implantar pausas no trabalho
Fonte: Fisioterapeuta Julio Vidal/ortopedista Mauro Fuziki
TRABALHO COM O COMPUTADOR
AMBIENTE ADEQUADO
Luminárias de teto
Filtros para dispersar a luz
Localização paralela ao monitor do computador
Ambiente
Neutro (acabamento das paredes e mobiliário não refletor)
Mínimo de ruído
Janela
Localizada no ângulo direito da tela do computador
Suporte de documento (móvel ajustável)
Monitor do computador
Posição da tela ajustável
Brilho e contraste ajustáveis
Teclado
Fino, separado e móvel
Descanso para os pés
Descanso para punho
Descanso para os braços
Cadeira
Giratória, rodas ou rodízios
Altura do teclado ajustável
Beirada da frente do assento arredondada
Descanso para os braços
Estação de Trabalho
Altura da superfície de trabalho ajustável
Altura do teclado ajustável
SETE ERROS DA ATIVIDADE
1 Não apoiar na cadeira
2 Joelhos dobrados e pés não apoiados no piso
3 Mesa instável ou inadequada
4 Monitor e teclados lateralizados
5 Posição inadequada do teclado
6 Flexão dos punhos
7 Falta de suporte de documento
POSTURA CORRETA FRENTE AO COMPUTADOR
1 Dorso apoiado
2 Pés apoiados e ângulo dos joelhos maior que 90º
3 Mesa firme, ajustada
4 Monitor e teclados em frente ao operador
5 Suporte de teclado ajustável
6 Ângulo de cotovelo maior 90º e punhos retos
7 Braços juntos ao corpo
ALÍVIO DA DOR
O poder das mãos
Dores ósseas e musculares causadas por posturas inadequadas e tendinites são alguns dos problemas que podem ser tratados por terapia manual. O tratamento fisioterápico estimula os pontos de dor na busca do alívio para o paciente
A utilização terapêutica das mãos na prevenção e no alívio das dores. Trata-se da Terapia Manual, que consiste na aplicação de técnicas de alongamento, descompressões, relaxamento, diretamente sobre o tecido muscular, ósseo, conjuntivos e nervosos, equilibrando e normalizando a sua atividade. O tratamento pode ser indicado para problemas como fadiga muscular, contraturas musculares, lombalgias, e tendinite (processo inflamatório dos tendões) relacionadas ou não ao trabalho.
Júlio Vidal, fisioterapeuta especializado em traumato-ortopedia, fisiologia e terapia manual, diz que a terapia oferece bons resultados e que nas primeiras sessões já se tem resposta do alívio da dor. Quando as dores são muito intensas, que impedem o toque, essa terapia pode ser associada a métodos fisioterápicos tradicionais como eletroterapia, crioterapia (uso de gelo). As manobras (toques) são dolorosas em decorrência da inflamação. "Mas são suportáveis e de imediato a pessoa já se sente aliviada".
Ele observa que as dores osteomusculares (óssea e muscular) são causadas por posturas inadequadas, esforço repetitivo, excesso de força para execução de determinados trabalhos, além de estresse, sedentarismo e falta de repouso. Mas os toques não se limitam apenas a diminuir as dores, servem também para relaxar e aumentar a amplitude de movimento do paciente.
Mas a exemplo de outras terapias, o sucesso do tratamento depende da mudança no estilo de vida. Ele inclui nesse contexto a reeducação corporal, o seguimento das recomendações terapêuticas como a realização de atividades físicas e aprendizagem de técnicas de relaxamento que ajudam a fortalecer o grupo muscular lesionado e tonificar a musculatura.
A terapia manual é uma parte da fisioterapia constituída por um conjunto de métodos e atos com a finalidade terapêutica e preventiva. As mãos são usadas de forma rigorosa, metódica, treinada e científica, a partir de anamnésia minuciosa e detalhada do paciente.
Segundo Vidal, o tempo de duração do tratamento com a terapia manipulativa varia de acordo com a patologia, da dor, da extremidade do corpo a ser tocada. Cada sessão dura em torno de 50 a 60 minutos e custa de R$ 50 a R$ 80,00. O procedimento é contra-indicado para fraturas, gestantes, portadores de osteoporose. Por isso, é importante a avaliação feita pelo fisioterapeuta. (Fátima Guimarães)
GINÁSTICA LABORAL
Em forma para o trabalho
Exercícios físicos, palestras educativas, assistência especializada em saúde, execução de medidas de proteção e segurança estão entre as ações desenvolvidas por algumas empresas para melhorar a qualidade de vida dos trabalhadores
A jornada é cansativa, mas eles enfrentam com disposição. Diariamente, 15 minutos antes de começarem a trabalhar, pontualmente às 7 horas, uma pausa para o alongamento e em seguida, todos já estão se movimentando, fazendo exercícios de flexibilidade, respiração e por último, relaxamento. Tudo isso, ao som de música eletrônica e no comando das atividades, um profissional de educação física. Essa cena se passa no setor de produção da Empesca Alimentos LTDA, uma indústria do setor de castanha, reúne mulheres e homens. É mais uma atividade do Programa Sesi Ginástica na empresa, que tem outras 34 participantes no Ceará.
"Alonga o pescoço, solta os ombros, vamos trabalhar o quadril", recomenda a educadora física Natércia Teixeira Brito, durante o alongamento dos operários da castanha. Essa fase prepara o corpo para o exercício de aquecimento. Com o uniforme de trabalho, eles seguem as orientações e, animados pela música, descontraem. A professora faz movimentos para os membros superiores e inferiores em conseqüência da atividades deles, que consistem em executar ações repetitivas como separar castanha, contar. Há aqueles que passam muito tempo sentados. A ordem é a ativar a circulação sangüínea.
Mesmo sendo no local de trabalho, uma área ampla, ventilada, a animação lembra uma academia de ginástica pela empolgação com que os funcionários fazem os exercícios. É o caso de Maria do Socorro Freitas Maciel, 29, lotada no setor de produção. "É muito bom começar o dia animada. Me sinto renovada depois dos exercícios, mais disposta". E esse é um dos objetivos da iniciativa, preparar os operários para mais uma jornada, evitando assim as doenças ocupacionais. Natércia diz que além de melhorar a parte física, prevenir dores, a ginástica tem influência na auto-estima, levando fazendo com que os trabalhadores desempenhem suas tarefas com mais disposição.
Um conjunto de ações para obter resultados satisfatórios. Para a fisioterapeuta da indústria Elisabeth Carvalho, iniciativas como a ginástica, palestras educativas sobre a importância de hábitos saudáveis de vida para prevenção de doenças, assistência especializada em saúde, segurança do trabalho, assistência social, estão mudando o dia-a-dia dos operários. Segundo ela, essas medidas surgiram paralelamente à implantação da ginástica laboral em 1999.
Desde a instalação do ambulatório de fisioterapia, há três anos, os trabalhadores são atendidos na própria indústria, que inclusive oferece programa de Reeducação Postural Global (RPG). Antes, eram encaminhados para clínicas. A fisioterapeuta observa que além do tratamento dos problemas crônicos, também estão atuando na prevenção de doenças. "Hoje quando alguém sente uma dor muscular, já procura o serviço. Nossa meta é trabalhar cada vez mais na prevenção". Segundo Elisabeth, durante o tratamento, o setor do operário é comunicado para exigir menos daquele profissional e se for o caso, mudar a função de trabalho para que a recuperação seja melhor. Além da fisioterapia, a empresa dispõe ainda de clínico geral, ginecologista, otorrino, nutricionista.
Alberto Sugahara, gerente industrial, diz que o reflexo da adesão ao programa já pode ser observado fora da empresa, pois há funcionários que passaram a fazer atividade física depois do expediente e estão mais conscientes sobre o cuidado com a saúde. Ele acrescenta que antes da empresa aderir à ginástica laboral, eram freqüentes as idas ao ambulatório por causa de queixas de dores musculares, e muitas vezes, a conseqüência era a ausência ao trabalho. "É um investimento que vale a pena, pois resulta na melhoria na qualidade de vida do trabalhador que dá resposta para empresa com produtividade e melhor nível de satisfação". (Fátima Guimarães)
Mais de 10 mil atendidos no Estado
O Programa Sesi Ginástica na Empresa, implantado no Ceará em 1984, reúne mais de 10 mil trabalhadores de 34 instituições, entre setor privado e órgãos públicos. O atendimento é personalizado, pois as ações são montadas de acordo com a atividade exercida pelos trabalhadores, espaço disponível para os exercícios, se a ginástica é de aquecimento, relaxamento, no início ou no intervalo do expediente.
A coordenadora do programa, Jeany Batista, diz que a iniciativa vai além da prática da ginástica laboral, pois incentiva as pessoas a aderirem um estilo de vida saudável, como prevenir as doenças ocupacionais. No entanto, ela ressalta que para viver com qualidade não basta só praticar uma atividade física. "As empresas têm de investir na melhoria do ambiente físico de trabalho, na sua organização".
Nesse contexto, ela inclui cadeiras e mesas ajustáveis ao funcionário, iluminação adequada, computadores com tela de proteção, ambiente refrigerado. "Não adianta fazer 10, 15 minutos de ginástica e depois estar no ambiente em que o indivíduo não consegue trabalhar, porque a cadeira o deixa com dores nas costas", acrescenta a educadora física especializada em ergonomia. Jeany lembra que a ginástica trabalha com o corpo do funcionário e a empresa tem que dar condições para que esse corpo possa trabalhe melhor.
O programa do Sesi, pioneiro no Ceará, nasceu porque os trabalhadores não tinham tempo para fazer exercícios oferecidos no próprio Sesi. Foi então montado o programa que leva a ginástica até o local de trabalho. "Funcionário saudável. Empresa saudável" é o slogan do programa. Ela acrescenta que existe um custo para empresa contratante, que fica recebendo consultoria do Sesi. "É um programa socioeducativo, lúdico e preventivo", destaca a fisioterapeuta.
Antes da implantação, a equipe do Sesi visita a instituição para analisar cada setor sobre as condições adequadas para realização da ginástica. Na pré-avaliação física inicial é feito levantamento sobre as dores e queixas, condicionamento físico de modo geral para aplicação dos exercícios físicos. Jeany Batista ressalta que o custo varia de uma empresa para outra, mas que é dado um acompanhamento periódico à empresa, e é feita pesquisa a fim de verificar o resultado e aceitação dos funcionários. Segundo ela, nos locais onde há ginástica laboral houve uma diminuição das queixas por dores musculares.
SERVIÇO - Programa Sesi Ginástica na Empresa - informações pelo fone (85) 3452-8520, de segunda a sexta-feira, no Sesi da Parangaba. Horário comercial. Na Internet: www.sfiec.org.br.
Dores, cirurgias e demissão
Depois de quase três anos na função de recepcionista, Maria Luzia Bezerra, 38, começou a sentir dormência na mão direita e muita dor no punho, mas não parou de trabalhar. “Cheguei a procurar a emergência porque não suportava as dores, quando passava o efeito da medicação, tudo voltava como antes”. Ela fez vários exames que deram apenas “suspeita” de tendinite. Mas o quadro se agravou e teve a indicação de cirurgia. Luzia acreditava que estava apta para retomar o trabalho e foi o que fez após a operação.
Como não mudou de ocupação no primeiro momento, o problema voltou um ano depois da cirurgia. “A gente quer manter o emprego e por isso procura fazer o melhor, nem que prejudique a saúde”. Ela ainda chegou a trabalhar como supervisora, mas não se livrou dos movimentos repititivos. Luzia foi para a terceira operação, já que estava perdendo o movimento da mão. Porém, além de sofrer com a dor física causada doença, todos os problemas que havia enfrentado para não perder o emgrego não foram suficientes. “Fui demitida”.
Maria Luzia observa que ficou muito abalada com a demissão e com o que ocorreu em conseqüência da medida adotada pela empresa. “Tenho deixado curriculum, preenchido ficha, mas é como se eu tivesse uma doença contagiosa”, relata. Sem condições de pagar aluguel, ela mora com os pais enquanto continua tentando retornar ao mercado de trabalho. Ela está sendo acompanhada no Centro Estadual de Referência de Saúde do Trabalhador (Cerest), onde faz terapia de grupo.
O CIDADÃO
"Mais animada e feliz"
Ela já trabalhou muito tempo sentada. Hoje, na função de contar castanha anda muito pelo setor de produção. Mas Antônia Brito, 29, não sente mais as dores na coluna e nas pernas como antigamente. "Sentia muito cansaço, mas depois da ginástica laboral estou muito bem". No entanto, as mudanças na vida dela foram além do ambiente de trabalho. Quando termina o expediente, Antônia vai fazer musculação. Segundo ela, o programa a despertou para a importância da atividade física, de hábitos alimentares saudáveis. "A ginástica traz harmonia e a gente começa o dia mais animada e feliz".
Ginástica preventiva
Para o auxiliar de produção Francisco Ivan Monteiro, 31, a ginástica é preventiva. "Não sinto nada, apesar do trabalho ser puxado". Ele acrescenta que gosta de fazer os exercícios, pois fica muito mais disposto e animado. Isso porque a ginástica é toda acompanhada por música. Além disso, o operário lembra que a professora estimula a todos com sua energia. Francisco ressalta que as orientações recebidas na empresa ajudaram também a ter mais cuidados com a saúde, escolher melhor o que vai comer. No fim de semana, garante que se diverte, mas reserva um tempo para o repouso.
Para diminuir os riscos
A estimativa da Organização Mundial da Saúde (OMS) é de que apenas 1% a 4% das doenças do trabalho são notificadas. Para minimizar os efeitos de agentes químicos, biológicos existem os Equipamentos de Proteção Individual (EPI), previstos nas Normas Regulamentadoras (NR) do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). É obrigação dos empregadores fornecer os EPI e dos empregados em usá-los. Porém, é fundamental que os trabalhadores sejam orientados e conscientizados sobre a importância de usar esses recursos corretamente, pois os equipamentos reduzem os riscos, mas o ambiente continua insalubre.
A médica do Trabalho Inês Bezerra de Figueiredo, que atua no Centro de Referência em Saúde do Trabalhador, diz que as doenças ocupacionais ocorrem com freqüência por causa da falta de educação continuada. Segundo ela, o processo de educação tem de partir do empregador. Ela observa que as doenças podem acometer dos menos aos mais especializados. Por isso, ressalta que é importante a realização dos exames periódicos, feitos de acordo com a atividade realizada e o agente nocivo ao qual o indivíduo está exposto. Além das Lesões por Esforços Repetitivos (LERs), onde a prevalência é maior, também se destacam a silicose, muito freqüente no Ceará, e as doenças dermatológicas. Também se enquadram nesse contexto os agravos causados pelos agrotóxicos, depressão. Essa última geralmente é identificada como sendo causada por problema familiar e dificilmente é relacionada à ocupação da pessoa.
Noberto das Chagas, médico perito do Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS), observa que é “responsabilidade do empregador a higienização do ambiente de trabalho e não lesionar seu funcionário”. Se não houver um trabalho educativo, os custos serão maiores com substituição de operário e pagamento de licença (os primeiros 15 dias de afastamento são bancados pelo empregador). Depois desse período, o trabalhador é submetido a perícia médica e o benefício é pago pelo INSS.
O chefe do Serviço de Gerenciamento de Benefício por Incapacidade do INSS, Wairon de Oliveira, observa que a LER é a doença do século XXI e lembra que as telefonistas passaram a ter menos problemas auditivos e estão contraindo mais lesões de punho. Para ele, as empresas estão mais cuidadosas com relação à saúde do trabalhador porque passaram a entender que os gastos serão maiores, principalmente, com as multas.
MAIS SAÚDE
Centro oferece assistência ao trabalhador
O Centro Estadual de Referência em Saúde do Trabalhador (Cerest-CE) oferece assistência médica especializada, psicólogos e advogado. A instituição é vinculada à Secretaria da Saúde do Estado
Contribuir para a melhoria da saúde do trabalhador. Essa é a missão do Centro Estadual de Referência em Saúde do Trabalhador (Cerest-CE), que além de oferecer atendimento com médicos do trabalho, psicólogos, orientação jurídica e previdência, também promove palestras e cursos de capacitação. Um deles está formando multiplicadores para depois atuarem como capacitadores dos profissionais do Programa Saúde da Família (PSF). A proposta é fazer com que as equipes possam identificar doenças ocupacionais.
A coordenadora do Cerest-Ce, Lucia Sales, diz que não é uma tarefa a mais para o PSF como pode parecer. "Queremos apenas que os profissionais tenham um olhar diferenciado e ao atender um paciente pensar se aquela doença tem relação com a atividade exercida". Ela observa que no Brasil existe uma subnotificação sobre quanto e como se adoece em relação ao trabalho. Isso ocorre, principalmente, no trabalho informal, onde se concentra 60% da mão-de-obra.
Ela acrescenta que uma das propostas do Cerest-CE para um futuro próximo é fomentar o Sistema Único de Saúde (SUS) para começar a registrar na avaliação do paciente questões sobre o trabalho. "Que o médico desconfie, por exemplo, que a gastrite pode ser em função da pressão que a pessoa sofre no seu local de trabalho e com isso possa intervir para evitar outras doenças". Segundo Lucia, é preciso pensar que se pode adoecer por causa da atividade que se exerce.
No Ceará, existem quatro sedes do Cerest. Além da estadual, as demais funcionam nas regiões do Juazeiro do Norte, Sobral e Horizonte. Em todo o País, o Ministério da Saúde (MS) já implantou 110 e tem como meta aumentar a rede para 200. Desses, há perspectiva de que quatro serão no Ceará, um deles em Fortaleza para atender Caucaia, Baturité, Itapipoca e Maracanaú. Lucia Sales ressalta que a saúde do trabalhador está garantida na Constituição na Lei Orgânica da Saúde, que estabelece que essa área é um segmento do SUS.
O Cerest-CE, que funciona há um ano, atua em três vertentes: assistência médica com profissionais especializados em saúde do trabalhador, enfermeira do trabalho, psicólogos, advogado. Qualquer trabalhador pode ter acesso à instituição, que é vinculada à Secretaria da Saúde do Estado (Sesa). Os médicos do trabalho do Cerest não prescrevem medicação e não fazem atendimento de emergência. A função desses profissionais é fazer uma relação (nexo causal) da queixa do trabalhador com a atividade que exerceu ou exerce e encaminhar para diagnóstico e tratamento.
Uma parceria com o curso de Psicologia da Universidade de Fortaleza (Unifor) garante terapia individual para os trabalhadores que têm indicação. No Cerest, os psicólogos fazem a terapia de grupo. O setor jurídico orienta sobre como requerer os direitos trabalhistas e previdenciários. O centro também fornece a homologação de deficiência, documento que possibilita ao portador de deficiência concorrer a cota que as empresas destinam ao deficiente. (Fátima Guimarães)
SERVIÇO - Centro Estadual de Referência em Saúde do Trabalhador: avenida do Imperador, 498 - Centro. Fone: (85)3101-5342. Funciona de segunda a sexta-feira, das 8 às 12h e das 14 às 17 horas.
Casos são subnotificados
A subnotificação dos casos esconde a real situação dos acidentes de trabalho e das doenças ocupacionais no Brasil. No Ceará, em 2004, foram registrados oficialmente 5.553 acidentes de trabalho, dos quais 505 doenças relacionadas ao exercício da atividade laboral, segundo dados do Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS). "A realidade é muito maior", alerta o coordenador do Fórum Estadual de Proteção ao Meio Ambiente do Trabalho (Fepmat), Dorelland Ponte Lima. O Fórum, que reúne representantes de órgãos públicos, privados, sindicatos de classe, atua na promoção da saúde e segurança dos trabalhadores.
Ele acrescenta que das estatísticas oficiais constam apenas os trabalhadores assegurados do INSS. "Nas mortes por acidentes de trabalho, no Estado, que varia de 40 a 50 por ano não estão incluídos os policiais assassinados no exercício da profissão", lembra. Outro aspecto que escapa dos levantamentos são os pequenos acidentes, onde muitas vezes o operário procura um serviço de saúde, mas não informa a circunstância em que se acidentou.
No caso das doenças relacionadas ao trabalho, ressalta que o problema é muito mais sério. E cita como exemplo as doenças causadas pelos agrotóxicos comuns aos agricultores, câncer ocupacional, silicose (causada pelo pó da sílica). Essa última atinge, principalmente, operários que trabalham na escavação de poços. "Tem aqueles que adoecem e não sabem que tem relação com a função e outros são obrigados a esconder temendo a demissão".
Campanhas, palestras, elaboração de material educativo para distribuir no setor público e privado, com entidades de classe, são algumas das ações desenvolvidas pelo Fepmat. Este ano, os integrantes do Fórum, que tem representes de órgãos como Procuradoria Regional do Trabalho (7ª Região), Delegacia Regional do Trabalho (DRT-CE), escolheram três eixos programáticos: acidentes de trabalho, estresse e violência e vigilância em saúde do trabalhador. "O ambiente de trabalho é essencial para saúde do trabalhador", observa Dorelland, que representa a DRT-CE, no Fórum.
No que se refere aos acidentes, ações serão desenvolvidas pelo Ministério Público do Trabalho, que expedirá notificações recomendatórias para que empregadores, federações e sindicatos cumpram a legislação que trata da Comunicação de Acidente de Trabalho (CAT). Também serão realizadas atividades educativas de conscientização da prevenção. Dorelland diz que o estresse está presente em qualquer atividade, inclusive, no empresário. Elaboração de banco de dados sobre riscos dos processos de produção por atividades econômicas, possibilitando conhecer melhor o perfil da população trabalhadora consta das medidas na área da vigilância em saúde.
Jornadas podem prejudicar
Jornada de trabalho excessiva, muita pressão para cumprir a escala de visita do dia e o estresse do trânsito. Para o vendedor L.M, 39, foram fatores que contribuíram para que sofresse acidente de moto. "Perdi a atenção e me acidentei no trânsito". Como o problema foi na mão, está fazendo fisioterapia. Porém, diz que por causa da atividade que exerce - passa o dia pilotando moto-, sente muitas dores na coluna e chega a faltar as aulas da faculdade. "No fim do dia minha coluna está acabada, não dá para ficar sentado assistindo aula".
Segundo ele, por volta das 6h30min já está em cima da moto. L. acrescenta que os movimentos repetitivos tornam o seu dia muito cansativo. "Se reclamar perde o emprego, pois a empresa não acredita em funcionário acidentado, doente, pois só interessa a produção". A situação do vigilante F.S, 48, não é diferente. Há 17 anos na função, F. fica sete horas em pé (tem uma hora de descanso), totalizando oito horas. O resultado foi um problema no joelho e dores nos tendões de aquiles. Sedentária, ela ressalta que mesmo cansando não pode sentar, pois é motivo de advertência ou até demissão. Quando termina o dia, ele revela que as pernas estão tão pesadas que fica difícil de andar. Ele está fazendo fisioterapia para aliviar as dores.
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