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terça-feira, 5 de maio de 2015

Juiz aposentado após cometer fraudes vai ganhar R$ 28 mil por mês

ENQUANTO MUITOS NÃO CONSEGUEM O BENEFÍCIOS, MESMO TENDO LAUDOS MÉDICOS, ESTE JUIZ CONSEGUE SE APOSENTAR DEPOIS DE COMETER CRIMES!,


Juracy José da Silva, que atuava no Norte do Estado, admite erros, mas alega doença mental

Condenado à aposentadoria compulsória pelo Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES), o juiz Juracy José da Silva vai receber cerca de R$ 28,9 mil pelo resto da vida.

Esse é o valor do salário bruto do magistrado hoje, mas o próprio juiz e seus advogados calculam que, com 30 anos de contribuição à previdência – sendo 10 anos e quatro meses na Justiça Estadual e o restante em outros cargos, como policial militar – o valor da aposentadoria proporcional, que é devida em casos de aposentadoria compulsória, não deve variar muito em relação ao subsídio atual. 

“Os valores podem até se equiparar”, avalia o advogado João Batista Barboza, que defende o juiz. Se fosse aposentado por invalidez, como o TJES chegou a determinar, em 2011, Silva também teria a aposentadoria integral, de R$ 28,9 mil.
 
Foto: Fernando Madeira
Juiz Juracy da Silva: transtorno bipolar o teria levado a contrair dívidas com partes de processos que julgou
O juiz diz que o valor não está no cerne da questão e que vai recorrer contra a aposentadoria forçada para reparar uma injustiça. Para o Pleno do TJES, o magistrado cometeu irregularidades quando atuava em comarcas no Norte do Estado, nos anos de 2008 e 2009.

No julgamento do Processo Administrativo Disciplinar (PAD), na última quinta-feira, o relator do caso, desembargador Samuel Meira Brasil, narrou que Silva entrou em descontrole financeiro e tomou empréstimos com partes em processos em que atuava; foi sócio de uma empresa – o que é vedado a membros da magistratura –, e ainda era próximo de autoridades públicas locais.

Um dos casos que chamou a atenção foi uma festa, dada em um sítio de Silva em Pinheiros, em que estariam presentes o ex-prefeito de Pedro Canário, Dr. Chicô, e sua esposa, Maria Teixeira Lessa, que havia ganhado a liberdade meses antes por meio de uma decisão do juiz.

Transtorno
Silva, no entanto, reconhece apenas que cometeu algumas dessas irregularidades. Ele alega, com apresentação de laudos psiquiátricos, que sofre de transtorno bipolar e que foi sob efeito da doença que praticou atos como os empréstimos com pessoas que eram partes em processos sob responsabilidade dele.

Na época, o magistrado acumulava o trabalho de cinco comarcas: Ecoporanga, Conceição da Barra, Jaguaré, São Mateus e Pinheiros, da qual era titular.

O juiz também aponta contradições na análise do caso por parte do TJES e, além de recorrer à Corte, assim que o acórdão for publicado, pode também acionar o Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

“Os laudos psiquiátricos não foram nem objeto de análise pelo relator do PAD”, afirma Silva.

O advogado Maycon Vicente da Silva, que atua no caso e é filho do magistrado, ressalta que a defesa não teve a oportunidade de se manifestar devidamente: “Fomos notificados apenas que haveria o julgamento sobre o desarquivamento do PAD e na mesma sessão eles julgaram o mérito”. 

A aposentadoria compulsória, com vencimentos proporcionais ao tempo de contribuição, é a pena máxima prevista na Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Loman).
 
Foto: TJES / Divulgação
Há quatro anos, Corte reconheceu distúrbios de juiz
Em 2011, TJES reconheceu doença mental
 
Em 2011, ao julgar um pedido de providências, o Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES) reconheceu que o juiz Juracy José da Silva sofre de transtorno bipolar e decidiu aposentá-lo por invalidez. O processo foi encaminhado ao Instituto de Previdência dos Servidores do Estado (IPAJM), que recusou o benefício. 

Por isso, o Procedimento Administrativo Disciplinar (PAD) contra Silva, que havia sido arquivado, foi reaberto. E foi do julgamento do PAD que surgiu a aposentadoria compulsória na semana passada.

A defesa do juiz aponta como controverso o entendimento do TJES nos dois episódios. Em 2011 o próprio desembargador Samuel Meira Brasil, que relatou o PAD, disse, em seu voto no pedido de providências, que uma psicóloga do tribunal informou que o magistrado já havia tentado o suicídio. 

“Os episódios referentes aos surtos revelam diversos sintomas psicóticos incapacitantes para a função do magistrado”, afirmou Meira Brasil, na época.

À reportagem, os advogados e o próprio juiz apresentaram laudos psiquiátricos, alguns anexados ao PAD e outros mais recentes, que atestam o transtorno.

Um dos laudos descreve que o magistrado, a partir de 2008, passou a apresentar os sintomas da doença, como “impulsividade, hipersexualidade, fuga de ideias e prolixidade”. “Contraiu dívidas, buscava alívio em mulheres, álcool e compras”, diz o texto de um dos laudos.

A defesa sustenta que o IPAJM não negou a aposentadoria por não reconhecer a doença e sim porque o TJES não realizou o procedimento adequado.
 
Análise
 
É uma situação desconfortável
 
Para demissão na iniciativa privada basta o patrão não gostar mais do trabalhador. No caso de servidor público, ele tem direito a defesa. Mas a Lei da Magistratura Nacional prevê a aposentadoria compulsória. Isso deixa os julgadores numa sinuca de bico porque, mesmo em casos graves, a aposentadoria compulsória é o máximo que podem fazer, administrativamente. É uma situação desconfortável para quem quer fazer justiça.

Julio Pompeu, professor de Direito
 
“Faço tratamento psiquiátrico e uso de medicamentos” 
 
Aos 47 anos, o juiz Juracy José da Silva está afastado das funções, recebendo o subsídio de R$ 28,9 mil brutos na íntegra, desde o final de 2011. Ele decidiu, ontem, falar à reportagem, pela primeira vez, sobre o caso que resultou em sua aposentadoria compulsória, pena determinada na última quinta-feira pelo Pleno do Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES). 

O magistrado pretende recorrer do que considera uma injustiça e um ato de discriminação em relação ao transtorno bipolar, doença da qual afirma sofrer. Confira o que ele disse: 

O senhor reconhece que cometeu as irregularidades apontadas no Procedimento Administrativo Disciplinar?
Algumas são verídicas: o endividamento, a compulsividade por compras. São sintomas compatíveis com o transtorno bipolar. Também reconheço os empréstimos (com pessoas que eram partes em processos), devido à falta de percepção da realidade.

E a festa em que o senhor recebeu como convidados um ex-prefeito e a esposa dele, beneficiada pelo senhor em uma decisão?
Foi o Ministério Público que pediu a liberdade dela. Eu apenas deferi e só atuei nesse processo porque o juiz de Pedro Canário se deu por impedido. Não me recordo desse fato noticiado da festa no sítio. Não me recordo da festa e nem se eles estavam lá.

E a proximidade com as autoridades locais? E a sociedade na empresa?
É comum o relacionamento de cordialidade entre autoridades do município. E eu nunca exerci qualquer atividade empresarial. 

Então a que o senhor credita a condenação que sofreu no TJES?
À discriminação em relação à doença, ao estigma da doença. O Tribunal de Justiça desconsiderou vários laudos médicos. 


E hoje o senhor não sofre mais da doença?
Eu faço tratamento psiquiátrico regular, com terapia e uso regular de medicamentos diários. E o meu caso não é isolado. A Amages (Associação dos Magistrados do Espírito Santo) fez um levantamento mostrando que vários magistrados e servidores sofrem da doença.

O senhor já recorreu da decisão?
Vou recorrer ao TJES e, se preciso, ao Conselho Nacional de Justiça.

Mesmo que o senhor considere a condenação uma injustiça, causa uma certa polêmica a pena de aposentadoria compulsória. Não fica parecendo, na verdade, impunidade?
Não vejo como impunidade. Tenho 30 anos de serviços prestados. Fui soldado da Polícia Militar do Espírito Santo, servidor da Justiça Federal, juiz do Estado de Rondônia e juiz do Espírito Santo.

Aposentadoria compulsória é uma garantia constitucional, dada a vitaliciedade do magistrado.

E seria uma diferença pequena, mínima (a aposentadoria integral, prevista com 35 anos de contribuição em relação à proporcional). A questão não é de vencimentos, é de justiça. Acredito fielmente na Justiça do Espírito Santo. Sei que o caso será revisto, dadas as inúmeras nulidades.

E foram fatos isolados. Antes disso, não havia nenhuma acusação contra a minha conduta.

Se o senhor conseguir reverter a aposentadoria compulsória, pretende retornar à atividade de magistrado?
Prefiro não pensar nisso agora. Quero ter o direito de me defender.
 


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