5 – A RESPONSABILIDADE CIVIL
O direito a reparação dos danos patrimoniais e morais sofridos, a chamada responsabilidade civil tem dois objetivos primordiais: o caráter pedagógico e preventivo e a condição pela qual é obtido o ressarcimento.
Giorgio Giorgi conceitua a Responsabilidade Civil como a obrigação de reparar mediante indenização quase sempre pecuniária, o dano que o fato ilícito causou a outrem (Freitas, 2004).
Responsabilidade, segundo o vocabulário jurídico de De Plácido e Silva (1992) origina-se do vocábulo responsável, do verbo responder, do latim respondere, que tem o significado de responsabilizar-se, vir garantindo, assegurar, assumir o pagamento do que se obrigou, ou do ato que praticou.
Civil refere-se ao cidadão, assim considerado nas suas relações com os demais membros da sociedade, das quais resultam direitos a exigir e obrigações a cumprir, conforme lembra Jadson Dias (1999).
Maria Helena Diniz (1993) conceitua a Responsabilidade Civil como a aplicação de medidas que obriguem uma pessoa a reparar o dano moral ou patrimonial causado a terceiros, em razão de ato por ele mesmo praticado, por pessoa por quem ela responde, por alguma coisa a ela pertencente ou de simples imposição legal. Caio Mário (1994) ressalva que o fundamento maior da responsabilidade civil está na culpa, lembrando que em sua prova está a base da responsabilização.
Para Alex Ribeiro (2003), citando Silvio Rodrigues, é profunda, misteriosa e sempre reveladora a área da responsabilidade civil, sendo a obrigação que pode incumbir uma pessoa a reparar o prejuízo causado a outra, por fato próprio, ou por fato de pessoas ou coisas que dela dependam.
Dos artigos 186 e 927 do Código Civil se extraem os elementos que compõem o dever de indenizar, quais sejam: elemento subjetivo da conduta: a) voluntariedade e culpabilidade em sentido estrito; b) elemento normativo da atividade: violação de direito ou causação de prejuízo; c) elemento objetivo da atividade em sentido estrito: ação ou omissão; d) elemento integrativo: liame de causalidade (Venosa, 2005).
O Dolo e a culpabilidade em sentido estrito (negligência, imprudência ou imperícia), em certos casos são dispensados, como no CDC. Não o são para a regra fixada no Código Civil por ter o legislador cristalinamente estampado que acolheu a teoria da responsabilidade civil subjetiva. Essa a regra. O CDC é a exceção com a responsabilidade civil objetiva, quando então não se perquirirá o elemento subjetivo da conduta (Ribeiro, 2003).
Como não se admite restrição de direito ou ampliação de responsabilidade senão nos casos expressamente previstos em lei (Stoco, 1997) toda a exceção tem de vir expressa em lei.
Para Rodrigues (2000) existem requisitos essenciais para a apuração da responsabilidade civil, como a ação ou omissão, a culpa ou dolo do agente causador do dano e o nexo de causalidade existente entre ato praticado e o prejuízo dele decorrente.
Os alicerces jurídicos em que se sustenta a responsabilidade civil, para efeito de determinar a reparação do dano injustamente causado, são oriundos da máxima romana neminem laedere (não lesar a ninguém) (Correia, 1999).
5.1 – ESPÉCIES
5.1.1 – Subjetiva e Objetiva
O Código Civil adotou a doutrina da culpa como princípio da responsabilidade civil estabelecendo que “aquele que por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito, ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano”. Para a verificação da responsabilidade necessitam-se quatro requisitos essenciais: a) a ação ou omissão; b) culpa ou dolo do agente; c) o nexo de causalidade; d) o dano sofrido pela vítima (Correia, 1999).
O dispositivo legal retrata os casos de responsabilidade aquiliana, refere-se a pessoa que causa um dano a outrem e obriga-a a ressarcir os prejuízos dele decorrentes. Essa teoria adotada pelo Código Civil denomina-se Teoria da Responsabilidade Subjetiva ou Teoria da Culpa e depende da comprovação da culpa (Diniz, 1993).
Há como exceção a Teoria da Responsabilidade Objetiva ou Teoria do Risco, na qual não há que se fazer prova da culpa, mas apenas do nexo de causalidade e do dano, conforme o ensinamento de Carlos Roberto Gonçalves (2005).
Em algumas circunstâncias a lei impõe a certas pessoas a reparação de um dano cometido sem culpa, são os casos de responsabilidade é legal ou objetiva. Basta a prova do dano e do nexo de causalidade. Esta teoria do Risco ou Objetiva tem que todo o dano é indenizável e deve ser reparado por quem a ele se liga por um nexo de causalidade.
Caio Mário da Silva Pereira (1993) conceitua o risco como o que se fixa no fato de que, se alguém põe em funcionamento uma qualquer atividade, responde pelos eventos danosos que esta atividade gera para os indivíduos independente de determinar se em cada caso, isoladamente, o dano é devido à imprudência, à negligência, a um erro de conduta, e assim se configura a teoria do risco criado.
A responsabilidade do advogado é subjetiva, segundo Jadson Correia (1999), pois é verificada mediante a verificação de culpa. O Código de Proteção e Defesa do Consumidor estabeleceu como regra a responsabilidade objetiva, no entanto para o profissional liberal, a lei fixou a responsabilidade subjetiva, na forma do artigo 14§4º. A justificativa se dá na medida em que os profissionais liberais são contratados ou constituídos com base na confiança que inspiram aos clientes (Pires, 2004).
A jurisprudência tem seguido a linha de que a responsabilidade civil do advogado é subjetiva, e, portanto, apurada mediante a verificação de culpa, a teor do Artigo 14, § 4º, do CDC, aplicável aos profissionais liberais . O entendimento mais verificado é de que o dever de indenizar se estabelece quando o advogado age com culpa, já que trata-se de responsabilidade contratual e subjetiva, que reclama prova cabal e inarredável.
5.1.2 – Contratual e Extracontratual
Nas Classificações de Responsabilidade civil temos a contratual e a extracontratual. A contratual é aquela oriunda do descumprimento de cláusula contratual, firmado entre as partes, que quebrado e gerando dano gera também o dever de indenizar por perdas e danos, de acordo com o Artigo 389 e seguintes e 395 e seguintes do Código Civil. .
Incorre em responsabilidade contratual aquele que age com mora no cumprimento da obrigação contratada. Na responsabilidade contratual, ao credor incumbe o ônus da prova no que tange ao descumprimento da obrigação, cabendo ao devedor demonstrar em sua defesa que o fato se deu em decorrência de caso fortuito ou força maior, ou ainda por culpa exclusiva da vítima (Correia, 1999).
A responsabilidade extracontratual é regulada pelos artigos 186 e 927 do Código Civil . Neste caso cabe ao autor demonstrar a culpa ou o dolo do agente, em decorrência de descumprimento do dever legal. Não há qualquer insatisfação de convenção prévia entre as partes nem vínculo jurídico entre a vítima e o agente causador do dano (Stoco, 1997).
Maria Helena Diniz (1993) afirma que a responsabilidade extracontratual é a oriunda da inobservância de previsão legal, ou seja, da lesão de um direito subjetivo, sem que haja nenhum vínculo contratual entre o agente causador do dano e a vítima.
A responsabilidade extracontratual será baseada na teoria da culpa, que deverá ser provada pelo lesado (Correia, 1999). Segundo Rui Stoco (1997) a responsabilidade extracontratual também se funda nos deveres gerais de abstenção ou omissão a que todos devem observar, como no caso dos direitos reais, dos direitos de personalidade e os direitos do autor. Para sua caracterização deve sempre ser demonstrado pela vítima o dano, o ato ilícito e a relação de causalidade, para que o agente causador seja condenado na reparação dos prejuízos que causou (Leonardo, 2002).
6 – RESPONSABILIDADE CIVIL DO ADVOGADO
Segundo ensina Maria Helena Diniz (1993) a responsabilidade civil do advogado assenta-se nos seguintes elementos: o ato (ou omissão) de atividade profissional; o dano material ou moral; o nexo de causalidade entre o ato e o dano; a culpa presumida do advogado; a imputação da responsabilidade civil ao advogado.
Para Rocha (2005) a atividade de advocacia não é livre, posto que dependente de requisitos, qualificações e controles previstas em lei, inserindo-se no conceito amplo de relação de consumo, pois o advogado é prestador de serviço profissional. A atividade obriga, e qualifica como culposa a responsabilidade pelo dano decorrente de qualquer de seus atos de exercício.
O advogado está sujeito a uma série de dispositivos legais, assentando-se sua responsabilidade sobre dispositivos constitucionais, de leis gerais e leis especiais.
6.1 – CONSTITUIÇÃO FEDERAL, CÓDIGO CIVIL E CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL
A Constituição Federal assegurou o direito à indenização por dano moral e material, conforme prescreve o Artigo 5º, incisos V e X . Por força dos referidos artigos a responsabilidade civil do advogado encontra guarida na Constituição Federal, assegurando aos clientes a base jurídica necessária à reparação dos danos materiais e morais ocasionados pela má atuação de seu procurador.
A inviolabilidade constitucional dos atos e manifestações do advogado restringe-se à esfera de seu exercício, conforme diz José Afonso da Silva, em Lopes (2002). É uma proteção do cliente que confia a ele documentos e confissões da esfera íntima, de natureza conflitiva e não raro objeto de reivindicação alheia, que precisam ser resguardados e protegidos de maneira qualificada.
Quanto ao Código Civil se trata da Lei que mais tem aplicabilidade no que diz respeito à responsabilidade civil. É a fonte de onde emana quase todo o fundamento da responsabilidade civil no Direito brasileiro (Correia, 1999).
O processo civil é delineado por traços técnicos, legais e próprios, pelo que somente aquele habilitado em curso superior de direito, regularmente inscrito na OAB, tem capacidade de postular em juízo. Assim, é exclusivamente do advogado a capacidade postulatória, sob pena de nulidade do processo no qual a parte esteja representada por quem não detenha a habilitação legal, indispensável ao exercício da advocacia (Lobo, 2002).
Para ser valida a representação requer a outorga de mandato, por instrumento público ou particular, podendo o advogado praticar todos os atos do processo, desde que contenha a procuração cláusula ad judicia, exceto aqueles a que a lei exige poderes especiais: receber a citação inicial, confessar, reconhecer a procedência do pedido, transigir, desistir, renunciar ao direito sobre que se funda a ação, receber, dar quitação e firmar compromisso .
O CPC trata ainda da boa e má-fé na litigância: São deveres não só das partes, mas também dos procuradores : a exposição dos fatos em juízo consoante a verdade; o procedimento com lealdade e boa-fé; a formulação de pretensões revestidas de fundamento; e a prática útil e necessária de atos e a produção de provas, indispensáveis à defesa do direito. Diversamente, ao enfocar a responsabilidade por dano processual o legislador refere-se somente ao autor, réu ou interveniente, não mencionando o advogado (Lopes, 2002).
Como a má-fé não se presume há a necessidade de demonstração que o litigante, voluntariamente, praticou determinada conduta danosa prescreve o CPC . Praticada qualquer conduta o juiz ou tribunal, até mesmo ex officio, condenará o litigante de má-fé ao pagamento de multa e de indenização, tendo ambas as verbas, como base, o valor da causa, conforme estabelece o Artigo 18 do CPC .
No feito executivo existem alguns atos do devedor que são considerados como atentatórios à dignidade da Justiça: fraude à execução; oposição maliciosa à execução, através de ardis e meios artificiosos; resistência injustificada aos comandos judiciais; e não indicação ao juiz onde se encontram os bens sujeitos à execução. Nessas hipóteses, incidirá o devedor em multa fixada pelo juiz, a qual reverterá em benefício do credor, resguardadas outras sanções de natureza processual ou material, a não ser que o devedor se comprometa a não mais praticar aquelas condutas e der fiador idôneo, que responda ao credor pela dívida principal, juros, despesas e verba honorária .
6.2 – ESTATUTO DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL
Os advogados como profissionais do Direito têm suas atividades regulamentadas diretamente pela Lei nº 8.906, de 04 de julho de 1994.
Jadson Correia (1999) lembra que a profissão é das mais antigas do mundo e teve sua evolução histórica através do tempo, sendo reconhecida no Brasil em 11 de agosto de 1827 e em 1930 foi criada a Ordem dos Advogados do Brasil, sendo a partir daí iniciada a regulamentação do profissional em solo nacional.
É o Estatuto que hoje disciplina a atividade da advocacia no Brasil, consagrando direitos do Advogado, estabelecendo incompatibilidades e impedimentos, fins e organização da OAB, composição e estrutura do Conselho Federal da OAB, entre outros assuntos (Lobo, 2002).
Para Lobo (2002) o estatuto estabeleceu em seu artigo 32 que o Advogado é responsável pelos atos que, no exercício da profissão, praticar com dolo ou culpa. Segundo Jadson Dias Correia (1999) tal regimento afasta a possibilidade de aplicação da Teoria do Risco para que o advogado seja condenado a reparar civilmente seu cliente, lembrando que a responsabilidade do advogado é a contrapartida pela sua independência.
O Estatuto da OAB, no artigo 33, dispõe sobre a obrigatoriedade do cumprimento do que estabelece o Código de Ética e Disciplina da OAB, do qual se tratará adiante.
O artigo 34 apresenta vinte e nove incisos onde enumera os casos de infração disciplinar. Dentre estes existem alguns em que a responsabilidade civil se apresenta claramente, como por exemplo no inciso VII, que trata da violação do segredo profissional sem justa causa, ou ainda no abandono da causa sem justo motivo ou antes de decorridos os dez dias da comunicação da renúncia ao mandato (Lobo, 2002).
Jadson Correia (1999) nos diz que o papel da Ordem dos Advogados do Brasil, no que diz respeito à apuração da responsabilidade civil dos advogados, restringe-se à apuração das infrações disciplinares e a aplicação da sanção disciplinar correspondente. Tais sanções estão previstas no artigo 35, consistindo em censura, suspensão, exclusão e multa.
Ernane Fidélis dos Santos, em Lopes (2002), lembra que além da aplicação da sanção processual, o juiz ou qualquer parte interessada pode também representar contra o advogado na OAB, para instauração de procedimento disciplinar.
Estas sanções não resolvem de forma alguma o problema do cliente que teve prejuízo pela má atuação do profissional. A responsabilidade civil do Advogado só pode ser estabelecida através de processo judicial. O processo disciplinar pode ser um subsídio para aquele cliente que desejar obter a reparação civil pelo dano causado, por culpa de seu patrono no exercício da profissão (Lobo, 2002).
Outra parte da jurisprudência e da doutrina, como ensina Ulisses Souza (2005), entendem que aí se assentam todos os fundamentos da responsabilidade civil dos advogados, já que esta é regulada em por norma contida em lei especial. Ora, sendo o Estatuto da Advocacia e da OAB uma lei especial, editada em data posterior ao Código de Defesa do Consumidor – que é uma lei geral – é incensurável a conclusão de que as normas consumeristas se mostram incompatíveis com o Estatuto da Advocacia. As normas do CDC, como afirmou a Conselheira Federal Gisela Gondim, não tem eficácia no que diz respeito às relações jurídicas estabelecidas entre os advogados e seus clientes, prevalecendo as normas do último diploma legal referido (EOAB) sobre as do primeiro (CDC). os serviços advocatícios não estão abrangidos pelo disposto no Artigo 3°, § 2°, do Código de Defesa do Consumidor. As prerrogativas e obrigações impostas aos advogados, como a necessidade de manter sua independência em qualquer circunstância e a vedação à captação de causas ou à utilização de agenciador, evidenciariam natureza incompatível com a atividade de consumo.
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