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quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

SAUDE DO TRABALHADOR


MINISTÉRIO DA SAÚDE
SECRETARIA DE ATENÇÃO À SAÚDE
DEPARTAMENTO DE AÇÕES PROGRAMÁTICAS ESTRATÉGICAS
ÁREA TÉCNICA DE SAÚDE DO TRABALHADOR
Lesões por Esforços Repetitivos (LER)
Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho (Dort)
Dor relacionada ao trabalho
Protocolos de atenção integral à
Saúde do Trabalhador de Complexidade Diferenciada
Autores:
Maria Maeno
Vera Salerno
Daniela Augusta Gonçalves Rossi
Ricardo Fuller
Colaboradores:
Alexandre Beltrami
Carlos Homsi
Cesar Augusto Patta
Mírian Pedrollo Silvestre
Paulo Roberto Kaufmann
Roberto Carlos Ruiz
Brasília/ DF Fevereiro 2006 2
Sumário
1. Introdução............................................................................................................................. 3
1.1. Escopo ............................................................................................................................... 5
1.1.1. Doença/Condição ........................................................................................................... 5
1.1.2. Tipo de Protocolo........................................................................................................... 6
1.1.3. Público-alvo .................................................................................................................... 6
1.1.4. Objetivo ........................................................................................................................... 6
1.1.5. Benefícios ....................................................................................................................... 6
2. Epidemiologia....................................................................................................................... 7
3. Metodologia .......................................................................................................................... 9
4. Recomendações................................................................................................................. 10
4.1. Diagnóstico: como identificar um caso de LER/DORT................................................ 18
4.1.1. Na rede assistencial da atenção básica..................................................................... 18
4.1.2. Conclusão diagnóstica ................................................................................................ 29
4.1.3. Conclusão e encaminhamento ................................................................................... 29
4.2. Rede Assistencial da Atenção Secundária................................................................... 32
4.2.1. O que considerar em um exame clínico reumatológico?......................................... 32
4.2.2. Diagnóstico Diferencial Com Artropatias .................................................................. 33
4.2.3. Exames Complementares............................................................................................ 34
4.3. Procedimentos terapêuticos .......................................................................................... 39
5. Fluxogramas ..............................................................................Erro! Indicador não definido.
6. Referências ................................................................................Erro! Indicador não definido.3
Introdução
A dor relacionada ao trabalho é descrita desde a Antigüidade (DEMBE 1996),
mas o registro clássico  sobre a descrição de vários ofícios e danos à saúde a eles
relacionados está contido na publicação de RAMAZZINI (1730). São citadas as
afecções dolorosas decorrentes dos movimentos contínuos da mão realizados pelos
escribas e notários, cuja função era registrar manualmente os pensamentos e
desejos de príncipes e senhores, com atenção para não errar.
Com a Revolução Industrial, esses quadros clínicos, configuraram-se
claramente como decorrência de um desequilíbrio entre as exigências das tarefas
realizadas no trabalho e as capacidades funcionais individuais, tornando-se mais
numerosos. A partir da segunda metade do século XX adquiriram expressão em
número e relevância social, com a racionalização e inovação técnica na indústria,
atingindo, inicialmente, de forma particular, perfuradores de cartão. Atualmente
essas expressões de desgaste de estruturas do sistema músculo-esquelético
atingem várias categorias profissionais e têm várias denominações, entre as quais
Lesões por Esforços Repetitivos (LER) e Distúrbios Osteomusculares Relacionados
ao Trabalho (Dort), adotadas pelos ministérios da Saúde e da Previdência Social.
A alta prevalência das LER/Dort tem sido explicada por transformações do
trabalho e das empresas, cuja organização tem se caracterizado pelo
estabelecimento de metas e produtividade, considerando suas necessidades,
particularmente de qualidade dos produtos e serviços e aumento da competitividade
de mercado, sem levar em conta os trabalhadores e seus limites físicos e
psicossociais. Exige-se adequação dos trabalhadores às características
organizacionais das empresas, pautadas pela intensificação do trabalho, aumento
real das jornadas, prescrição rígida de procedimentos, impossibilitando
manifestações de criatividade e flexibilidade. Às exigências psicossociais não
compatíveis com características humanas, nas áreas operacionais e executivas
adiciona-se o aspecto físico-motor, com alta demanda de movimentos repetitivos,
ausência e impossibilidade  de pausas espontâneas, necessidade de permanência
em determinadas posições por tempo prolongado, atenção para não errar e
submissão a monitoramento de cada etapa dos procedimentos, além de mobiliário,
equipamentos e instrumentos que não propiciam conforto.  4
Entre os vários países que viveram epidemias de LER/Dort estão a Inglaterra,
os países escandinavos, o Japão, os Estados Unidos, a Austrália e o Brasil. A
evolução das epidemias nesses países foi variada e alguns deles continuam ainda
com problemas significativos, dentre os quais o Brasil.
 A ocorrência das LER/Dort em grande número de pessoas, em diferentes
países e em atividades consideradas leves, provocou uma mudança no conceito
tradicional de que o trabalho pesado, envolvendo esforço físico, é mais desgastante
que o trabalho leve. As polêmicas em diversos países e as lutas pelo
reconhecimento como agravos relacionados ao trabalho propiciaram a abertura de
trincheiras para a afirmação de um conceito mais amplo do adoecimento no mundo
do trabalho.
Diferentemente do que ocorre com doenças não ocupacionais, as doenças
relacionadas ao trabalho têm implicações legais que atingem a vida dos pacientes.
O seu reconhecimento é regido por normas e legislação, conforme a finalidade. A
Portaria GM 777, do Ministério da Saúde, de 28 de abril de 2004, tornou de
notificação compulsória vários agravos relacionados ao trabalho, entre os quais
LER/Dort, cujo protocolo é este que se apresenta. Neste caso, não há implicações
diretas para o paciente, pois a finalidade é a notificação para prevenção de novos
casos,  de agravamento  dos já existentes e organização de serviços e
especialidades necessárias, por meio de intervenções nas áreas de assistência,
vigilância e planejamento. Para os segurados do Seguro Acidente de Trabalho
(SAT), além da notificação ao sistema de informação da Saúde, é necessário
notificar à Previdência Social e neste caso, há conseqüências diretas para o
paciente, pois a partir do reconhecimento de uma doença ocupacional pela
Previdência Social e incapacidade para o trabalho, há concessão de auxílio-doença
por acidente de trabalho para trabalhadores com necessidade de afastamentos
maiores de 15 dias (auxílio-doença de espécie 91 – B91). A concessão de auxíliodoença por acidente de trabalho implica manutenção do recolhimento do fundo de
garantia durante o afastamento do trabalho e estabilidade durante um ano após o
retorno ao trabalho.
As LER/Dort, no Brasil, foram primeiramente descritas como tenossinovite
ocupacional. Foram apresentados, no XII Congresso Nacional de Prevenção de
Acidentes do Trabalho - 1973, casos de tenossinovite ocupacional em lavadeiras, 5
limpadoras e engomadeiras, recomendando-se que fossem observadas pausas de
trabalho daqueles que operavam intensamente com as mãos.
No campo social, sobretudo na década de 80, os sindicatos dos trabalhadores
em processamento de dados travaram uma luta pelo enquadramento da
tenossinovite como doença do trabalho. Nestes últimos anos, várias outras
entidades nosológicas, além da tenossinovite passaram a ser incluídas entre as
LER/Dort pelo Ministério da Saúde (Protocolo de investigação, diagnóstico,
tratamento e prevenção – 2000, Manual de procedimentos para doenças
relacionadas ao trabalho, capítulo XVIII – 2001) e pelo  Ministério da Previdência
Social (anexo II do decreto 3.048/99 e instrução normativa 98/03).
Em 28 de abril de 2004, o Ministério da Saúde publicou a Portaria 777/04, que
tornou de notificação compulsória vários agravos à saúde relacionados ao trabalho.
Entre eles, as LER/Dort.
1.1. Escopo
1.1.1. Doença/Condição
Para efeito deste protocolo, são considerados sinônimos lesões por esforços
repetitivos (LER), distúrbios osteomusculares relacionados ao trabalho (Dort),
síndrome cervicobraquial ocupacional, afecções músculo-esqueléticas relacionadas
ao trabalho (Amert), lesões por traumas cumulativos (LTC). As denominações
oficiais do Ministério da Saúde e da Previdência Social são LER e Dort, assim
grafadas: LER/Dort.
As Lesões por Esforços Repetitivos (LER) e Distúrbios Osteomusculares
Relacionados ao Trabalho (Dort) são por definição um fenômeno relacionado ao
trabalho (KUORINKA e FORCIER 1005). São danos decorrentes da utilização
excessiva, imposta ao sistema músculo-esquelético, e da falta de tempo para
recuperação. Caracterizam-se pela ocorrência de vários sintomas concomitantes ou
não, de aparecimento insidioso, geralmente nos membros superiores, tais como dor,
parestesia, sensação de peso e fadiga. Abrangem quadros clínicos do sistema
músculo-esquelético adquiridos pelo trabalhador submetido a determinadas
condições de trabalho. 6
Entidades neuro-ortopédicas definidas como tenossinovites, sinovites,
compressões de nervos periféricos podem ser identificadas ou não. É comum a
ocorrência de mais de uma dessas entidades nosológicas e a concomitância com
quadros inespecíficos, como a síndrome miofascial. Freqüentemente são causas de
incapacidade laboral temporária ou permanente.
Os objetivos dos profissionais de saúde na abordagem às  LER/Dort, não
devem se restringir ao acolhimento humanizado e qualificado nos serviços
assistenciais, mas também, de manter uma atitude ativa frente às possibilidades de
prevenção que cada caso pode oferecer, ou seja, a cada caso diagnosticado, buscar
a possibilidade de uma ação  de vigilância e intervenção para que se evitem novos
casos.
1.1.2. Tipo de Protocolo
Diagnóstico e Tratamento.
1.1.3. Público-alvo
Este protocolo é destinado a profissionais da rede de saúde que atendem os
trabalhadores, seja no Sistema Único de Saúde (SUS) e serviços privados, seja nos
serviços de saúde das empresas e serviços especializados de segurança e medicina
do trabalho (Sesmt).
1.1.4. Objetivo
Tem como objetivo orientar os profissionais que prestam assistência a
trabalhadores a identificar e notificar os casos de LER/Dort, conforme determina a
Portaria GM 777 de 28/04/04, bem como dar subsídios aos órgãos de vigilância para
intervenções nos ambientes de trabalho.
1.1.5. Benefícios
A adoção do protocolo propiciará a melhor identificação e abordagem dos
casos de LER/Dort. 7
Epidemiologia
 Estudos têm demonstrado que trabalhadores de diversos ramos de atividades
estão expostos a condições de trabalho que propiciam a ocorrência e/ou
agravamento de quadros relacionados às LER/Dort. Abaixo são citados alguns
desses estudos, lembrando que devem ser considerados exemplificativos de
situações que podem ser identificadas em outras populações de trabalhadores:
Maior prevalência de
afecções de ombros
População de trabalhadores
HERBERTS e col. 1981 soldadores de estaleiros
HERBERTS e col. 1984 chapeadores de estaleiros
SILVERSTEIN 1985 trabalhadores industriais expostos à alta repetitividade e
força
LUOPAJÄRVI e col. 1979 trabalhadores de linhas de montagem de embalagens
McCORMACK e col. 1990 trabalhadores de manufatura
KUKKONEN e col. 1983 trabalhadoras de entrada de dados
VIIKARI-JUNTURA 1983 trabalhadores de abatedouros
Maior prevalência de epicondilites
laterais
População de trabalhadores
KURPPA e col. 1991 cortadores de carne
KURPPA e col. 1991 empacotadoras
ROTO e KIVI 1984 cortadores de carne
McCORMACK e col.1990 trabalhadores de manufatura
VIIKARI-JUNTURA e col. 1991 cortadores de carne, empacotadores e
enchedores de lingüiça
Maior prevalência de tendinites de
mãos e punhos
Populações de trabalhadores
KURPPA e col. 1991  empacotadores
KURPPA e col. 1991 enchedores de lingüiça
KURPPA e col. 1991 cortadores de carne
SILVERSTEIN 1985 trabalhadores industriais submetidos à alta
repetitividade e força, à alta força e baixa
repetitividade, à baixa força e alta
repetitividade
Achados de afecções músculo-esqueléticas multi-tissulares
OXENBURGH 1984 digitadores
BRISSON e col. 1989 costureiras
JONSSON e col. 1988 montadores de componentes eletrônicos
BERG e col. 1988 trabalhadores de estaleiros
SILVERSTEIN  e col. 1987 trabalhadores do setor de investimentos
PUNNET e ROBINS 1985 trabalhadores do setor de vestuário
OHLSSON e col. 1989 montadores de setor plástico
HANSEN e JEUNE 1982 trabalhadores de lavanderias 8
BRANSON e col. 2004 estudaram auxiliares de odontologia, que teriam
posturas inadequadas para aplicar polimento das obturações, com repercussões no
sistema músculo-esquelético. Alguns estudos compararam populações submetidas a
alta repetitividade de movimentos com outras não expostas, focando a prevalência
de síndrome do túnel do carpo: BARNHART e col. 1991 (trabalhadores industriais),
CHIANG e col. 1990 (trabalhadores de fábrica de comida congelada),
SCHOTTLAND e col. 1991 (trabalhadores de avícolas).
Outras atividades foram identificadas em serviços que atendem trabalhadores,
entre as quais, as de teleatendimento, caixa, digitação, escrituração, montagem de
pequenas peças e componentes, manufaturados (calçados), costura, embalagem,
telefonistas, passadeiras, cozinheiras, trabalhadores de limpeza, auxiliares de
odontologia, cortadores de cana  controle de qualidade, de enfitadeiro, montador de
chicote, montador de tubos de imagem, operação de máquinas, operação de
terminais de computador, auxiliar de administração, auxiliar  -de contabilidade,
operação de telex, datilografia, pedreiro, secretário, técnico administrativo, auxiliar
de cozinha, copeiro, eletricista, escriturário, operador de caixa, recepcionista,
faxineiro, ajudante de laboratório, viradeiro e vulcanizador (NUSAT 1994; MAENO e
col. 2001).
Dados do INSS de 2002 evidenciam que dos trabalhadores que receberam
benefícios por incapacidade com síndrome cervicobraquial relacionada ao trabalho,
72% foram bancários. Também dos benefícios por incapacidade concedidos a
trabalhadores com tenossinovites e sinovites relacionadas ao trabalho, 55,3% foram
concedidos a bancários (BARBOSA-BRANCO 2002).  9
Metodologia
A partir de levantamento bibliográfico foi redigida uma proposta de protocolo.
Formou-se uma equipe de trabalho composta por profissionais do SUS com
experiência na abordagem de casos de LER/Dort, alguns dos quais haviam
participado de processos de discussão de outros protocolos. Especialistas das áreas
de reumatologia e diagnóstico por imagem, com experiência no tema, integraram a
equipe de discussão sobre as questões específicas.
Após a realização da consulta pública e discussão com a Coordenadoria de
Saúde do Trabalhador do Ministério da Saúde chegou-se ao formato atual.  10
Recomendações
A etiologia das LER/Dort é multifatorial. Diferentemente de uma intoxicação por
metal pesado, cuja etiologia é claramente identificada e mensurável, no caso das
LER/Dort, é importante analisar os vários fatores de risco envolvidos direta ou
indiretamente. Os fatores de risco não são necessariamente as causas diretas das
LER/Dort, mas podem gerar respostas que produzem as LER/Dort. Na maior parte
das vezes, foram estabelecidos por meio de observações empíricas e depois
confirmados com estudos epidemiológicos (KUORINKA e FORCIER 1995).
Os fatores de risco não são independentes, interagem entre si e devem ser
sempre analisados de forma integrada. Envolvem aspectos biomecânicos,
cognitivos, sensoriais, afetivos e de organização do trabalho. Por exemplo, fatores
organizacionais como carga de trabalho e pausas para descanso podem controlar
fatores de risco de freqüência e intensidade.
Na caracterização da exposição aos fatores de risco “físicos”, não
organizacionais, quatro elementos se destacam:
Região anatômica submetida
aos fatores de risco
Punho, cotovelo, ombro, mão, pescoço, etc.
Intensidade dos fatores de risco
Variação de tempo dos fatores de
risco
Duração do ciclo de trabalho, distribuição
das pausas, estrutura de horários, etc
Tempo de exposição aos fatores
de risco
Tempo de latência das LER/Dort pode
variar de dias a décadas (KIVI 1984,
CASTORIA  e col. 1990, HAGBERG e col.
1990)
Os grupos de fatores de risco das LER/Dort podem ser relacionados com
(KUORINKA e FORCIER 1995):
a.  O posto de trabalho. Embora as dimensões do posto de trabalho não
causem distúrbios músculo-esqueléticos por si, elas podem forçar o
trabalhador a adotar posturas, a suportar certas cargas e a se comportar
de forma a causar ou agravar afecções músculo-esqueléticas. Ex.:
mouse com fio curto demais, obrigando o trabalhador a manter o tronco
para frente sem encosto e o membro superior estendido; reflexos no
monitor atrapalham a visão, o que obriga o trabalhador a permanecer 11
em determinada postura do corpo e da cabeça para vencer essa
dificuldade.
b.  Exposição a vibrações. As exposições a vibrações de corpo inteiro, ou
do membro superior, podem causar efeitos vasculares, musculares e
neurológicos.
c.  Exposição ao frio. A exposição ao  frio pode ter efeito direto sobre o
tecido exposto e indireto pelo uso de equipamentos de proteção
individual contra baixas temperaturas (ex. luvas).
d.  Exposição a ruído elevado.  Entre outros efeitos, a exposição a ruído
elevado pode produzir mudanças de comportamento.
e.  A pressão mecânica localizada. A pressão mecânica provocada pelo
contato físico de cantos retos ou pontiagudos de  objetos, ferramentas e
móveis com tecidos moles de segmentos anatômicos e trajetos nervosos
provocando compressões de estruturas moles do sistema músculoesquelético.
f.  Posturas.  As posturas que podem causar afecções músculoesqueléticas possuem três características que podem estar presentes
simultaneamente:
•  posturas extremas que podem forçar os limites da amplitude das
articulações. Ex.: ativação muscular para manter certas posturas
(ZIPP e col. 1983), postura de pronação do antebraço
(MARKISON 1990).
•  a força da gravidade impondo aumento de carga sobre os
músculos e outros tecidos. Ex.: ativação muscular do ombro
(HAGBERG 1981, JONSSON 1982).
•  posturas que modificam a geometria músculo-esquelética e
podem gerar estresse sobre tendões, músculos e outros tecidos
e/ou reduzir a tolerância dos tecidos. Ex.: desvio do trajeto de um
tendão por contato do punho (TICHAUER 1966, ARMSTRONG e 12
CHAFFIN 1978, KEIR e WELLS 1992); diminuição da perfusão
tecidual quando o membro superior direito está acima da altura do
coração (HOLLING e VEREL 1957); efeito da flexão/ extensão e
pronação/ supinação do cotovelo (TICHAUER 1996).
g.  A carga mecânica músculo-esquelética.  A carga músculo-esquelética
pode ser entendida como a carga mecânica exercida sobre seus tecidos
e inclui:
•  tensão (ex.: tensão do bíceps);
•  pressão (ex.: pressão sobre o canal do carpo);
•  fricção (ex.:  fricção de um tendão sobre a sua bainha);
•  irritação (ex.: irritação de um nervo).
Entre os fatores que influenciam a carga músculo-esquelética, encontramos: a
força, a repetitividade, a duração da carga, o tipo de preensão, a postura  e o
método de trabalho.
a.  A carga estática. A carga estática está presente quando um membro é
mantido numa posição que vai contra a gravidade. Nesses casos, a
atividade muscular não pode se reverter a zero (esforço estático). Três
aspectos servem para caracterizar a presença de posturas estáticas: a
fixação postural observada, as tensões ligadas ao trabalho, sua
organização e conteúdo.
b.  A invariabilidade da tarefa. A invariabilidade da tarefa implica
monotonia fisiológica e/ou psicológica. Assim, a carga mecânica fica
restrita a um ou poucos segmentos corpóreos, amplificando o risco
potencial.
c.  As exigências cognitivas. As exigências cognitivas podem ter um
papel no surgimento das LER/Dort, seja causando um aumento de
tensão muscular, seja causando uma reação mais generalizada de 13
estresse.
Os fatores organizacionais e psicossociais ligados ao trabalho. Os fatores
psicossociais do trabalho são as percepções subjetivas que o trabalhador tem dos
fatores de organização do trabalho. Ex.: considerações relativas à carreira, à carga e
ritmo de trabalho e ao ambiente social e técnico do trabalho. A “percepção“
psicológica que o indivíduo tem das exigências do trabalho é o resultado das
características físicas da carga, da personalidade do indivíduo, das experiências
anteriores e da situação social do trabalho.
A seguir referências bibliográficas de estudos sobre fatores de risco posturais.
Há que se ter bom senso na análise de cada caso, não levando à risca
apenas condições estudadas. Os estudos devem ser vistos como orientadores
e não determinantes, devendo-se sempre abrir possibilidades para novas
formas de exposição aos fatores de risco para a ocorrência de LER/Dort.
Fatores de risco posturais citados em literatura para os ombros
Fator de risco Resultados
encontrados nos estudos
Referências
Abdução de mais de 60º
ou flexão por mais de 1 h/dia
Dor aguda em ombro e
pescoço
Bjelle e col. 1981
Flexão de menos de 15º
e abdução de 10º do braço
para trabalho contínuo com
baixa carga
Aumento de
afastamentos do trabalho
por problemas do sistema
músculo-esquelético
Aaras e col. 1988
Abdução maior que 30º Fadiga rápida em
abduções maiores
Chaffin 1973
Abdução maior que 45º Fadiga rápida a 90º Herberts e col. 1980 14
Abdução maior que 100º Síndrome da
hiperabdução com
compressão de vasos
sangüíneos
Beyer and Wright 1951
Flexão dianteira de 30º
do ombro
Abdução maior que 30 º
Diminuição do fluxo
sangüíneo no músculo
supraespinhal
Järvholm e col. 1998
Järvholm e col. 1990
Mãos não mais que a
35º acima do nível do ombro
Início de fadiga
muscular local
Wiker e col. 1989
Flexão ou abdução do
membro superior a mais de
90º
Sinais
eletromiográficos de fadiga
muscular local em menos de
1 minuto
Hagberg 1981
Mãos ao nível dos
ombros ou abaixo
Tendinite a outros
danos no ombro
Bjelle e col., 1979
Herberts e col., 1981
Herberts e col., 1984
Flexão repetitiva do
ombro
Fadiga aguda Hagberg, 1981
Abdução ou flexão
repetitiva do ombro
Sintomas em pescoço
e ombros negativamente
relacionados ao movimento
Kilbom e col., 1986
Posturas que
demandem carga estática em
ombros
Tendinite e outros
danos em ombro
Luopajarvi e col., 1979
Elevação do membro
superior
Dor Sakakibara e col., 1987
Elevação do ombro Sintomas em pescoço Jonsson e col., 1988 15
e ombro
Elevação do ombro e
abdução do membro superior
Sintomas em pescoço
e ombro
Kilbom e col., 1986
Abdução e flexão
dianteira demandando cargas
estáticas em ombros
Dor em ombros e
afastamentos do trabalho
devido a problemas
músculo-esqueléticos
Aaras and Westgaard
1987; Aaras e col., 1987
Alcance superior e
suspensão
Dor Bateman, 1983
Fatores de risco posturais citados na literatura para o pescoço
Fator de risco  Resultados
encontrados nos estudos
Referências
Flexão estática Ausência de dor no
pescoço ou alterações
eletromiográficas à flexão de
15º por 6 horas. À flexão de
30º, após 300 minutos
ocorrência de dor intensa. À
flexão de 60º, após 120
minutos ocorrência de dor
intensa
Chaffin, 1973
Flexão Inclinação da cabeça a
mais de 56º: dor e
sensibilidade ao exame
físico em 2/3 dos casos
Hunting e col., 1981
Flexão dinâmica Flexão média entre 19
e 39º: poucos afastamentos
Aaras e col., 1988 16
do trabalho por problemas
músculo-esqueléticos
Flexão estática
máxima
Desenvolvimento
rápido de dor e fim da
mobilidade
Harms-Ringdahl and
Ekholm, 1986
Fatores de risco posturais citados na literatura para cotovelos e antebraços
Fator de risco Resultados encontrados
na literatura
Referências
Pronação Grande aumento de
atividade do pronador teres e
pronador quadratus a mais de
60º de pronação
Zipp e col., 1993
Fatores de risco posturais citados na literatura para mãos e punhos
Fator de risco Resultados encontrados
na literatura
Referências
Flexão do punho Síndrome do túnel do
carpo. Exposição por mais de
20 a 40 horas/ semana
De Krom e col.,
1990
Flexão do punho Aumento da pressão
sobre o nervo mediano
Smith e col., 1977
Flexão do punho Aumento da ativação do
músculo flexor do dedo para
Moore e col., 1991 17
agarramento
Flexão do punho Compressão no nervo
mediano pelos tendões flexores
Armstrong and
Chaffin, 1978; Moore e
col., 1991
Flexão do punho Compressão do nervo
mediano pelos tendões flexores
Keir and Wells,
1992
Extensão do punho Síndrome do túnel do
carpo. Exposição por mais de
20 a 40 horas/ semana
De Krom e col.,
1990
Extensão do punho Aumento da pressão do
túnel intra-carpal para extensão
extrema de 90º
Gelberman e col.,
1981
Extensão do punho Aumento do estresse do
nervo mediano para extensão
de 45 a 90º
Smith e col., 1977
Desvio ulnar do punho Desvio maior que 20º,
aumento de dor e achados
patológicos
Hunting e col., 1981
Posições de desvio de
punho
Trabalhadores com
síndrome do túnel do carpo
usaram esta postura mais
freqüentemente
Armstrong and
Chaffin, 1979
Manipulação da mão Mais de 1500 – 2000
manipulações por hora levam a
tenossinovite
Hammer, 1934
Movimentos do punho 1276 movimentos de
flexão extensão levam à fadiga
Bishu e col., 1990
Movimentos do punho Acelerações maiores do
punho e velocidades em
Marras e
Schoenmarklin, 1993 18
trabalhos de alto risco para
LER/Dort
Fonte: KUORINKA e FORCIER 1995.
1.2.  Diagnóstico: como identificar um caso de LER/Dort
1.2.1. Na rede assistencial da atenção básica
Como em qualquer consulta, deve-se coletar dados fornecidos pelo paciente,
realizar o exame físico, integrá-los com dados epidemiológicos e fazer uma hipótese
diagnóstica. A organização atual dos serviços de saúde permite que várias das
etapas de coleta de dados sejam realizadas por outros profissionais, além do
médico. Isso não exime o médico de seu papel, porém, permite a análise dos casos
mediante informações coletadas por equipes de saúde, como ocorre no Programa
Saúde da Família (PSF).
Quando se parte do quadro clínico, a seqüência a ser obedecida na anamnese
clínica é a seguinte:
a) História das queixas atuais
b) Indagação sobre os diversos aparelhos
c) Comportamentos e hábitos relevantes
d) Antecedentes pessoais
e) Antecedentes familiares
f) Anamnese ocupacional
g) Exame físico geral e específico
h) Exames complementares e/ou avaliação especializada, se necessário
i)  Investigação do posto/ atividade de trabalho in loco, se necessário
Fase de coleta de informações do paciente (itens a a f) 19
ESCUTAR O PACIENTE
COM ATENÇÃO
 
a. História das queixas atuais
As queixas mais comuns são dor localizada, irradiada ou generalizada,
desconforto, fadiga e sensação de peso. Muitos relatam formigamento, dormência,
sensação de diminuição de força e fadiga, edema e enrijecimento muscular, choque,
falta de firmeza nas mãos. Nos casos mais crônicos e graves, pode ocorrer
sudorese excessiva nas mãos e alodínea (sensação de dor como resposta a
estímulos não nocivos em pele normal). Geralmente os sintomas são de evolução
insidiosa até serem claramente percebidos. Com freqüência, são desencadeados ou
agravados após períodos de maior quantidade de trabalho ou jornadas prolongadas
e em geral, o trabalhador busca formas de manter o desenvolvimentos de seu
trabalho, mesmo que às custas de dor. A diminuição da capacidade física passa a
ser percebida no trabalho e fora dele, nas atividades cotidianas.
Deve-se investigar tempo de duração, localização, intensidade, tipo ou padrão,
momentos e formas de instalação, fatores de melhora e piora, variações no tempo.
b. Indagação sobre os diversos aparelhos
Como em qualquer caso clínico, a indagação por outros sintomas e doenças já
diagnosticadas faz parte da consulta clínica, devendo ser considerados na análise
do quadro clínico. Atenção para traumas, esforço muscular agudo, doenças do
tecido conjuntivo, artrites, diabetes mellitus, hipotireoidismo, anemia megaloblástica,
História das queixas atuais
Indagação sobre os diversos aparelhos
Comportamento e hábitos relevantes
Antecedentes individuais
Antecedentes familiares
Anamnese ocupacional 20
algumas neoplasias, artrite reumatóide, espondilite anquilosante, esclerose
sistêmica, polimiosite, gravidez, menopausa.
Ao achado de qualquer doença deve-se indagar se sua existência explica o
quadro clínico. A identificação de uma doença não ocupacional não descarta a
existência concomitante de LER/Dort. Ressalte-se que algumas doenças, como o
hipotireoidismo, são freqüentes entre a população feminina acima dos 45 anos de
idade e em geral são oligossintomáticas.
c. Comportamento e hábitos relevantes
Atividades extra-laborais devem ser identificadas, mas geralmente não são
consideradas desencadeadoras de quadros músculo-esqueléticos semelhantes às
LER/Dort. Para terem significado como causa, os fatores não ocupacionais devem
ter intensidade e freqüência similares as dos fatores ocupacionais conhecidos, o que
raramente acontece. É freqüente o depoimento de médicos e profissionais da saúde
mais experientes de que quando as mulheres trabalhavam apenas no seu lar, não
havia relato de casos tão numerosos de “tendinites” e nem tão graves.
d.  Antecedentes pessoais
Traumas, fraturas e outras formas de adoecimento pregresso que possam ter
desencadeado e/ou agravado processos de dor crônica, entrando como fator de
confusão, devem ser considerados.
e.  Antecedentes familiares
A existência de diabetes e outros distúrbios hormonais e  “reumatismos” deve
ser considerada, como em qualquer outro caso.
f) Anamnese ocupacional
Esta etapa de coleta de informações é de fundamental importância para que
situações de sobrecarga do sistema músculo-esquelético sejam identificadas. O
relato do paciente costuma ser rico em detalhes, propiciando a caracterização das
condições de trabalho em boa parte dos casos. Devem chamar a atenção as
atividades operacionais que envolvam movimentos repetitivos, jornadas
prolongadas, ausência de pausas periódicas, exigência de posturas desconfortáveis
por tempo prolongado, exigência de produtividade, exigência de força muscular, 21
identificação de segmentos do corpo com sobrecarga e maior grau de exigência,
ritmo intenso de trabalho, ambiente estressante de cobranças de metas, falta de
reconhecimento profissional. Equipamentos e instrumentos de trabalho
inadequados. Postos de trabalho ocupados anteriormente devem ser considerados.
g) Exame físico do sistema músculo-esquelético
Primeira etapa: inspeção
A inspeção se inicia à entrada do paciente no consultório. Avaliam-se a forma
de caminhar (uniformidade, simetria e postura dos membros superiores), de se
sentar e se posicionar diante do médico. Posições antálgicas ou cuidado especial
com determinados segmentos afetados por dor podem ser percebidos já nesta fase
do exame físico.
A inspeção deve ter como objetivo identificar posturas anormais, assimetrias,
edemas, alterações de cor de pele, deformidades, características de anexos, tais
como unhas e pelos.
Em fases avançadas de dor complexa regional, por exemplo, à simples
inspeção é possível identificar alterações de cor de pele, sudorese excessiva e
edema, e mais raramente, a assimetria no comprimento de pelos e unhas.
Segunda etapa: palpação
A palpação permite a identificação de alterações de consistência da pele e dos
demais tecidos moles, em particular os músculos. Podem ser encontradas
nodulações (císticas ou não), zonas de contraturas em grupos musculares afetados
e o paciente pode referir sensibilidade dolorosa excessiva ao simples toque
(alodínea).
Terceira etapa: manobras clínicas
AQUI ENTRA UM ARQUIVO DE
FOTOGRAFIAS DE MANOBRAS CLÍNICAS 22
NESTE MOMENTO DA CONSULTA, O MÉDICO JÁ PODE TER UMA HIPÓTESE DIAGNÓSTICA CONSISTENTE.
SE HOUVER DÚVIDAS, DEVE RECORRER AOS RECURSOS DA ATENÇÃÓ SECUNDÁRIA.
h) Exames complementares e/ou avaliação especializada, se necessário
Antes de solicitar os exames, o médico deve se fazer as seguintes perguntas:
•  Qual é a hipótese diagnóstica?
•  Qual é o objetivo dos exames ou da avaliação especializada?
Após a realização dos exames, o médico deve se fazer as seguintes perguntas:
•  Os achados dos exames complementares são compatíveis com os
achados da história clínica e do exame físico?
•  As alterações encontradas explicam todo o quadro clínico do paciente?
•  Qual é o significado da ausência de alterações nos exames? Descarta
minha hipótese diagnóstica?
Análise dos dados coletados, aspectos epidemiológicos e achados de
exame físico.
 É a etapa de juntar os dados e analisar o caso. É importante considerar as
queixas clínicas, início e evolução, casos semelhantes descritos em literatura, no
mesmo ramo de atividade econômica ou entre pacientes das mesmas empresas,
características da organização de trabalho e dos fatores de risco existentes.
Doenças que podem ser relacionados ao trabalho e que especificamente
podem ser enquadradas como LER/Dort, que constam da lista de doenças
relacionadas ao trabalho do Ministério da Saúde e do Ministério da Previdência
Social:
ƒ Síndrome cervicobraquial (M53.1)
ƒ Dorsalgia (M54.-)
ƒ Cervicalgia (M54.2)
ƒ Ciática (M54.3) 23
ƒ Lumbago com ciática (M54.4)
ƒ Sinovites e tenossinovites (M65.-)
ƒ Dedo em gatilho (M65.3)
ƒ Tenossinovite do estilóide radial (De Quervain) (M65.4)
ƒ Outras sinovites e tenosinovites (M65.8)
ƒ Sinovites e tenossinovites não especificadas (M65.9)
ƒ Transtornos dos tecidos moles relacionados com o uso, o uso excessivo e a
pressão, de origem ocupacional (M70.-)
ƒ Sinovite crepitante crônica da mão e do punho (M70.0)
ƒ Bursite da mão (M70.1)
ƒ Bursite do olecrano (M70.2)
ƒ Outras bursites do cotovelo (M70.3)
ƒ Outros transtornos dos tecidos moles relacionados com o uso, o uso
excessivo e a pressão (M70.8)
ƒ Transtorno não-especificado dos tecidos moles relacionados com o uso, o
uso excessivo e a pressão (M70.9)
ƒ Fibromatose da fáscia palmar: contratura ou moléstia de Dupuytren (M72.0)
ƒ Lesões do ombro (M75.-)
ƒ Capsulite adesiva do ombro (ombro congelado, periartrite do ombro)
(M75.0)
ƒ Síndrome do manguito rotador ou síndrome do supra-espinhoso (M75.1)
ƒ Tendinite biciptal (M75.2)
ƒ Tendinite calcificante do ombro (M75.3)
ƒ Bursite do ombro (M75.5)
ƒ Outras lesões do ombro (M75.8)
ƒ Lesões do ombro não-especificadas (M75.9)
ƒ Outras entesopatias (M77.-)
ƒ Epicondilite medial (M77.0)
ƒ Epicondilite lateral (cotovelo do tenista) (M77.1)
ƒ Outros transtornos especificados dos  tecidos moles não classificados em
outra parte (inclui mialgia) (M79.-)
Obs.: A lista acima é exemplificativa. O capítulo XVIII do Manual de
Procedimentos para os Serviços de Saúde/ Doenças Relacionadas ao Trabalho, do 24
Ministério da Saúde, publicado em 2001 e disponível no site  www.saude.gov.br,
descreve cada uma das entidades nosológicas de forma mais detalhada.
 Uma entidade nosológica não especificada no Manual de Procedimentos para
os Serviços de Saúde/ Doenças Relacionadas ao Trabalho, mas freqüente, é a
síndrome do impacto.
 A  síndrome do impacto  é uma lesão do tendão supraespinhal e da bursa
subacromial subdeltóidea quando  comprimidas entre a cabeça do úmero e o arco
córacoacromial. O pinçamento pode decorrer de osteófitos originados de
osteoartrose acrômio clavicular, alterações morfológicas do acrômio, hipertrofia do
ligamento coraco-acromial. O quadro é freqüente em indivíduos que realizam
movimentos de elevação dos membros superiores acima da cabeça de forma
repetitiva. O quadro clínico é de dor ao elevar o braço, piora com o decúbito
horizontal, com irradiação para a face lateral do braço, redução da força de rotação
externa e abdução. Ao exame físico há dificuldade para elevação do braço, dor à
elevação súbita do braço (teste de Neer), redução da força e dor na rotação externa
quando o braço estiver abduzido em 90º (teste de Jobe).
Da lista anterior, segundo literatura internacional, pode-se citar ainda as
seguintes entidades nosológicas (KUORINKA & FORCIER 1995):
ƒ Síndrome do desfiladeiro torácico
ƒ Síndrome do supinador
ƒ Síndrome do pronador redondo
ƒ Síndrome do interósseo posterior
ƒ Síndrome do túnel do carpo
ƒ Síndrome do túnel ulnar
ƒ Síndrome do canal de Guyon
ƒ Tenossinovite dos extensores e ou dos flexores dos dedos e do carpo
ƒ Tendinite do tendão de Aquiles
ƒ Mialgias, distúrbio multitissular ou sintomas músculo-esqueléticos
inespecíficos
ƒ Osteoartrite da articulação cromioclavicular, do punho, das articulações
interfalangianas distais e ou proximais, metacarpofalangiana, 25
carpometacarpiana, do cotovelo, coxartrose, artrite do joelho (tibiofemoral
ou gonartrose)
ƒ Síndrome do dedo branco, enfermidade da vibração
Três entidades nosológicas, freqüentemente relacionadas às LER/Dort,
merecem destaque pela por serem menos conhecidas e gerarem confusões.
Refletem processos crônicos de difícil controle sintomático, mesmo com afastamento
dos fatores de risco, exigindo uma abordagem interdisciplinar tanto no tratamento
como na reabilitação profissional.
São elas:
¾ Síndrome dolorosa miofascial
Estudo do Departamento de Ortopedia e Traumatologia do Hospital das
Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo mostrou que
94,5% dos pacientes com LER/Dort  tinham síndrome dolorosa miofascial (LIN e col.
1997).
Definição: afecção álgica do aparelho músculo-tendíneo-ligamentar que
acomete músculos, tendões, fáscias e ligamentos.
Sintomas: dor e aumento da tensão dos músculos afetados. Presença de
pontos dolorosos (pontos-gatilho) e bandas musculares. Quando estimulados ou
pressionados reproduzem o padrão da dor referida. São considerados ativos quando
presentes na área de referência da dor e latentes quando em áreas assintomáticas.
Dependendo do grau de estímulo, os pontos-gatilho latentes podem tornar-se ativos.
Os sintomas dolorosos crônicos são resistentes a várias formas de tratamento e
freqüentemente persistem mesmo quando os pacientes são afastados dos fatores
que ocasionaram o quadro clínico.
Etiologia e fisiopatologia: fadiga e isquemia muscular localizada, devido à
contração estática, repetições, posturas inadequadas, estresses emocionais
parecem estar envolvidos em sua gênese. O desequilíbrio entre a demanda e a
necessidade metabólica predispõe á fadiga muscular e comprometimento do
desempenho funcional. O espasmo é caracterizado pelo deslizamento concêntrico 26
das fibras musculares, das extremidades tendíneas em direção ao ventre muscular.
Há desenvolvimento da tensão contínua sem relaxamento. Nos pacientes com
LER/Dort, músculos acessórios são freqüentemente solicitados para auxiliar a
realização das atividades laborais. Ocorrendo fadiga e dor, o membro contralateral
muitas vezes é utilizado na tentativa de compensar as disfunções do membro
acometido. A fraqueza muscular está relacionada ao desbalanço entre a atividade
que é requerida e a capacidade anátomo-funcional dos músculos que estão
envolvidos no movimento. As ações musculares compensatórias podem justificar a
ampliação da área acometida, ou mesmo do segmento primariamente não
envolvido. As alterações no mecanismo de controle motor central resultam em
desbalanço entre a atividade motora de contração e relaxamento dos músculos
agonistas e antagonistas, e podem justificar o acometimento das cadeias
musculares anterior e posterior, principalmente nos pacientes de maior gravidade e
nos lesados crônicos.
A síndrome dolorosa miofascial pode estar associada ou ser secundária a
outras afecções músculo-esqueléticas, metabólicas como o diabetes mellitus e o
hipotireoidismo, inflamatórias e/ou infecciosas (LIN e col 1999).
Localização: os músculos cervicais, escapulares e do membro superior, como
o trapézio, o bíceps braquial, os extensores e flexores do punho e dedos da mão e
os intrínsecos da mão, freqüentemente são afetados.
¾ Fibromialgia
Critérios para classificação de fibromialgia (1990), do Colégio Americano de
Reumatologia, que devem ser referência.
A dor de padrão fibromiálgico sem o achado de dor nos 11 dos 18 tender points é
comum nos casos de LER/Dort.
1. História de dor disseminada
A dor é considerada disseminada nas seguintes condições:
ƒ  atinge os lados esquerdo e direito do corpo; 27
ƒ  atinge o segmento acima e abaixo da cintura;
ƒ  dor axial (coluna cervical ou tórax anterior ou coluna torácica ou coluna
lombar).
2. Dor em pelo menos 11 dos 18 tender points à palpação digital com força de
aproximadamente 4 kg: occipitais, cervicais, trapézios, supraespinhais, segundas
costelas, epicôndilos laterais, glúteos, grandes trocanteres, joelhos.
Em estudo do Departamento de Ortopedia e Traumatologia do Hospital das
Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo verificou-se que
20,2% dos pacientes com LER/Dort tinham dor generalizada e 32,7% tinham tender
points e trigger points de padrão fibromiálgico (LIN e col. 1997). Essa concomitância
de acometimentos localizados com dores generalizadas tem sido freqüentemente
identificada entre os serviços que atendem o trabalhador, bem como a evolução de
processos dolorosos delimitados para quadros fibromiálgicos. Em nenhum desses
casos pode se descartar em princípio a existência da relação entre o quadro clínico
e o trabalho.
¾ Síndrome complexa de dor regional  (LIN, TEIXEIRA e ROGANO 1999)
Conceito e etiologia: as condições álgicas associadas a anormalidades
neurovegetativas foram englobadas sob a denominação de síndrome complexa de 28
dor regional (SCDR). Sua etiologia é ainda polêmica. OCHOA e VERDUGO (1993),
após extensa revisão bibliográfica, concluíram que há diferentes processos
neuropáticos, centrais, periféricos e psicogênicos que podem produzir sinais e
sintomas similares em diferentes doentes e que vários mecanismos fisiopatogênicos
podem interagir no  mesmo doente. Concluíram também que o papel da disfunção
do sistema nervoso neurovegetativo simpático na gênese da dor é questionável.
Sintomas e sinais: dor, alodínea, hiperestesia, hiperpatia, hiperalgesia,
alterações vasomotoas e sudomotoras, comprometimento da função muscular,
amiotrofia, atrofia de pele, anexos, ossos e articulações, retrações músculotendíneas e articulares. A adoção do padrão auto-alimentador da dor-imobilizaçãoedema-alterações-neurovegetativas-desuso-dor, quando cronificado, limita a função
motora, causa alterações tróficas irreversíveis, compromete o humor, o sono o
apetite, as atividades familiares, sociais e profissionais. As variadas apresentações
clínicas, a incerta fisiopatologia e a imprevisão quanto ao padrão evolutivo, tornam o
tratamento destas entidades um desafio para os estudiosos envolvidos no
tratamento das síndromes álgicas.
Classificação: distrofia simpático-reflexa ou síndrome complexa de dor
regional tipo I, quando não há lesão nervosa e síndrome complexa de dor regional
tipo II, quando há lesão nervosa.
Tem sido encontrada com freqüência em pacientes com LER/Dort e são de difícil
remissão. 29
ƒ A concomitância de ocorrência  das diversas entidades nosológicas
acima citadas é comum nos casos de LER/Dort.
 Conclusão diagnóstica
O paciente tem LER/Dort apresentando determinadas formas clínicas.
ou
O paciente tem LER/Dort e concomitantemente tem outro quadro clínico com
sintomas músculo-esqueléticos.
ou
O paciente tem sintomas músculo-esqueléticos não relacionados com o trabalho.
1.2.2. Conclusão e encaminhamento
Se:
•  o paciente apresenta quadro clínico característico,
•  a anamnese ocupacional evidencia fatores de risco para a ocorrência de
LER/Dort
•  e o ramo de atividade/ função é  conhecido como de risco para a ocorrência
de LER/Dort (há evidência epidemiológica),
¾ o caso deve ser notificado ao sistema de informação (SINAN) e à
Previdência Social (emissão de CAT) como LER/Dort.
Se:
•  o paciente apresenta quadro clínico característico,
•  a anamnese ocupacional evidencia fatores de risco para a ocorrência de
LER/Dort
•  mas o ramo de atividade/ função não é conhecido como de risco para a
ocorrência de LER/Dort,
¾ o caso deve ser notificado ao sistema de informação (SINAN) e à Previdência
Social (emissão de CAT) como LER/Dort e
¾ o caso deve ser notificado aos órgãos de vigilância sanitária para análise  das
condições de trabalho.
Este é o evento sentinela. 30
Se:
•  o paciente apresenta quadro clínico característico,
•  a anamnese ocupacional não permite identificar fatores de risco para a
ocorrência de LER/Dort
•  mas  o ramo de atividade/ função é  conhecido pela existência de fatores de
risco para a ocorrência de LER/Dort (há evidência epidemiológica),
o caso deve ser notificado ao sistema de informação (SINAN) e à Previdência
Social como LER/Dort. Ao mesmo tempo os órgãos de vigilância sanitária devem ser
notificados para que haja confirmação diagnóstica de LER/Dort.
Se:
•  o paciente apresenta quadro clínico característico,
•  a anamnese ocupacional não permite identificar fatores de risco para a
ocorrência de LER/Dort
•  e o ramo de atividade/ função do paciente não é  conhecido pela existência
de fatores de risco para a ocorrência de LER/Dort,
¾ deve-se apenas encaminhar o paciente para tratamento clínico e
acompanhamento.
Se:
•  o paciente apresenta quadro clínico característico,
•  a anamnese deixa dúvidas quanto à existência de fatores de risco para
a ocorrência de LER/Dort
•  e não se tem informação sobre o ramo de atividade/ função do paciente
¾ deve-se encaminhar o Centro de Referência em Saúde do
Trabalhador para elucidação da relação do quadro clínico com o
trabalho.
Se: 31
•  o paciente apresenta quadro clínico característico,
•  a anamnese ocupacional deixa dúvidas quanto à existência de fatores
de risco para a ocorrência de LER/Dort,
•  mas  o ramo de atividade/ função é conhecido pela existência de fatores
de risco para a ocorrência de LER/Dort (há evidência epidemiológica),
¾  o caso deve ser notificado ao sistema de informação (SINAN) e à
Previdência Social como LER/Dort.
Se:
•  o paciente não apresenta quadro característico ou se houver dúvidas e
necessidade de avaliação clínica especializada (reumatologista,
neurologista, ortopedista) e/ou exames complementares (radiografia, ultrasonografia, ressonância magnética),
¾ deve-se encaminhar o paciente para as referências de especialidades
clínicas necessárias e/ou exames complementares, conforme o plano
diretor regional (PDR) e pactuação programada integrada (PPI).
Dependendo dos resultados dessa investigação mais aprofundada,
investiga-se a etiologia ocupacional.
IMPORTANTE:
A etapa do estabelecimento da relação de causa e/ou agravamento entre o
trabalho e o quadro clínico é atribuição multidisciplinar; pressupõe a técnica de
realizar uma boa anamnese ocupacional, que não é atribuição exclusivamente
médica.
Os casos notificados ao SINAN devem ter também Comunicação de Acidente
do Trabalho (CAT) emitida, caso o trabalhador tenha vínculo empregatício vigente,
regido pela CLT e seja segurado do Seguro de Acidente do Trabalho (SAT) do INSS,32
sendo que o médico assistente ou serviço de saúde pode abrir a CAT ou fazer esta
solicitação ao empregador, inclusive na suspeição, conforme prevê o artigo 169 da
CLT, a instrução normativa 98 do INSS e a resolução do Conselho Federal de
Medicina 1488 / 98.
1.3. Rede Assistencial da Atenção Secundária
O clínico da unidade de saúde da atenção básica encaminha pacientes aos
especialistas com dúvidas referentes ao quadro clínico, uma vez que os casos de
baixa complexidade podem ser diagnosticados e acompanhados na própria unidade
básica de saúde, a exemplo do que acontece com qualquer especialidade médica.
Assim, quando necessário este encaminhamento, ele espera dessa avaliação a
confirmação ou não de uma hipótese diagnóstica de diferentes campos de
conhecimento.
Espera-se dos especialistas uma avaliação clínica bem feita assim como a
realização de exames complementares necessários, escolhidos de forma criteriosa.
Espera-se de um especialista o seu conhecimento especializado e a sua
experiência. A simples realização de um rol de exames para “descartar” qualquer
problema não é conduta adequada, ressaltando-se que os exames complementares
sempre devem ser avaliados à luz da clínica.
Doenças como artrite reumatóide, espondilite anquilosante, polimiosite e
esclerose sistêmica podem produzir sintomas que podem exacerbar aqueles
produzidos pelas LER/Dort.
1.3.1. O que considerar em um exame clínico reumatológico?
Na avaliação da dor e outros sintomas músculo-esqueléticos, uma anamnese e
exame físico cuidadosos trazem grande potencial de esclarecimento etiológico. Uma
dor contínua, que pode persistir mesmo ao repouso sugere um provável processo
inflamatório. A dor ao movimento, chamada dor mecânica sugere LER/Dort. Por
outro lado, a dor protocinética, com melhora com o decorrer da persistência do
movimento sugere uma osteoartrose. A dor noturna ocorre também relacionada à
inflamação. 33
Quadros puramente articulares tendem a ter os sintomas restritos ao local
afetado, enquanto reumatismos de partes moles, como as tendinopatias,
apresentam sintomas menos restritos a um local anatômico, irradiando-se proximal e
distalmente. Nesse segmento, via de regra, há um ponto ou trajeto mais doloroso à
palpação que corresponde exatamente à estrutura lesada. Numa tendinopatia da
origem dos extensores dos punhos, por exemplo a dor é pontual na palpação do
epicôndilo lateral, porém pode irradiar-se distalmente no antebraço.
A aplicação de manobras que induzem tração e compressão, ativas ou
passivas, possibilita uma eficiente estratégia de avaliação dinâmica, muitas vezes
até fechando diagnósticos.
Não é de se admirar, portanto, que a avaliação clínica cuidadosa pode apontar
diagnósticos, etiologia e até mecanismos fisiopatogênicos nas LER/Dort, e com
alguma freqüência é mais sensível e específico que exames complementares
isolados. Há casos de achados clínicos evidentes, com ultrassonografia ou
ressonância magnética dentro de padrões de normalidade, bem como situações de
lesões evidenciadas por esses métodos com pacientes assintomáticos.
Assim, a apreciação conjunta e crítica dos exames complementares à luz da
clínica é fundamental.
1.3.2. Diagnóstico Diferencial Com Artropatias
a) Artrite reumatóide
É uma artropatia inflamatória crônica de grandes e pequenas articulações
periféricas. Com alguma freqüência, a coluna cervical também é atingida. São
características a rigidez matinal por mais de 30 minutos, o caráter simétrico e o
envolvimento dos punhos, articulações metacarpo-falangeanas e interfalangeanas
proximais. Acomete também a bainha sinovial dos tendões, podendo, conforme a
topografia, confundir-se com reumatismos extra-articulares. A radiografia
convencional e a ultrassonografia revelam a o característico envolvimento articular
erosivo e cístico. A artrite reumatóide tem progressão freqüente para a deformidade.
b) Osteoartrose 34
É uma artropatia decorrente de uma lenta degradação da cartilagem articular,
podendo ou não apresentar alguma grande inflamação articular. Está muito
relacionada a suporte de carga excessiva pela articulação. Existe uma forma
generalizada, de natureza genética, que surge após os 45 anos, que atinge as mãos
em 85% dos pacientes, determinando um alargamento articular de natureza óssea
nas articulações interfalangeanas distais mais comumente (nódulos de Heberden) e
proximais (nódulos de Bouchard). Outra forma é a secundária à hipersolicitação
mecânica local, que nas mãos acomete a articulação carpo-metacarpiana do
polegar, conhecida como sizartrose, que ocorre em virtude do movimento de pinça
do polegar. Pela localização confunde-se com a tendinite de DeQuervain. Nas
radiografias, chama a atenção a remodelação óssea que é responsável pelos
osteófitos.
c) Doenças difusas do tecido conjuntivo (lupus eritematoso sistêmico,
esclerose sistêmica, síndrome de S Jögren e dermatopolimiosite)
 A manifestação articular nessas doenças, embora inflamatória, é leve, sem
erosões e não deformante. O diagnóstico diferencial com reumatismo de partes
moles é feito pela presença significativa de manifestações sistêmicas.
d) Artropatias microcristalinas (gota e condrocalcinose)
Caracterizam-se por crises de mono ou oligoartrite com duração de 3 a 7 dias,
de forte intensidade e resolução espontânea, que se repetem em semanas ou
meses. O diagnóstico diferencial com reumatismos de partes moles é a evolução
episódica e auto-limitada.
e) Dores músculo-esqueléticas de origem metabólica
Alguns pacientes com hipotireoidismo e hiperparatireoidismo podem manifestar
dores difusas pelo corpo que podem ser confundidas com síndrome miofascial ou
fibromialgia. Nos casos suspeitos, avaliam-se os hormônios tireoidianos, TSH, cálcio
sérico e urinário e hormônio de paratireóide.
1.3.3. Exames Complementares
Pressupostos:35
ƒ Só se deve solicitar exames complementares se houver uma hipótese
diagnóstica.
ƒ Deve-se considerar que alterações de exames complementares sem
correspondência clínica devem ser ignoradas.
ƒ A ausência de alterações de exames complementares não descarta a
existência de sintomas incapacitantes.
ƒ Provas de atividade inflamátoria não devem ser solicitadas, a não ser nos
casos em que há quadro clínico e exame físico compatível com doença
reumática.
ƒ 30% da população assintomática e não adoecida têm determinados
indicadores de atividade reumática presentes.
ƒ A atribuição de estabelecer nexo de causa e/ou agravamento entre as
condições de trabalho e o quadro clínico não é exclusividade de nenhum
profissional em especial. Quando há condições de se estabelecer a
relação entre o trabalho e o quadro clínico, deve-se fazê-lo. Nos casos
mais complexos é atribuição dos órgãos de vigilância e centros de
referência em saúde do trabalhador.
h) Esta etapa é multidisciplinar, pois pressupõe o conhecimento da técnica
de extrair informações do trabalhador por meio de um aprofundamento da
anamnese ocupacional e/ou avaliação da atividade de trabalho in loco
(Anexo VII: análise de atividades de trabalho).
Avaliação laboratorial
Provas de atividade inflamatória
Correspondem à velocidade de hemossendimentação, proteína C reativa,
alfa 2 e gamaglobulinas, entre outros. Quando os resultados são elevados são
indicadores de processo inflamatório, e não reumático, como são freqüente e
incorretamente interpretados. Dificilmente se elevam nos reumatismos extraarticulares ou de partes moles. Estão elevados em artropatias inflamatórias
crônicas (artrite reumatóide por exemplo) e agudas (artropatias microcristalinas e infecciosas por exemplo).
A velocidade de hemossedimentação eleva-se também em algumas
situações não inflamatórias, tais como gestação, anemias, obesidade, 36
hipercolesterolemia e insuficiência renal. Pode estar elevada em mulheres.
Fator reumatóide (FR)
É um anticorpo geralmente da classe IgM dirigido contra uma
imunoglobulina do próprio organismo. O teste utilizado para sua detecção é o
látex. Está presente em 75% dos casos de artrite reumatóide, porém também
ocorre com menor freqüência e em títulos mais baixos em outras doenças
crônicas como tuberculose, Hansen, doenças pulmonares e hepáticas.
Também pode estar presente em 2 a 5 % dos indivíduos saudáveis.
Atualmente está disponível também o teste para detecção de anticorpo
antipeptídeo citrulinado, mais sensível e específico que o fator reumatóide.
Fator antinuclear (FAN)
Trata-se na verdade de uma família de auto-anticorpos, contra vários
antígenos celulares, detectados através de diversos métodos. Cada elemento
dessa família tem sua própria sensibilidade e especificidade para algumas
doenças difusas do tecido conjuntivo. Alguns anticorpos tipo FAN podem ser
detectados em baixos títulos em até 22,6% dos indivíduos saudáveis
(FERNANDEZ e col. 2003).
Anti-estreptolisina O (ASLO)
Este anticorpo é um indicativo de infecção estreptocóccica recente e não
um marcador de febre reumática. Apenas 2 % dos indivíduos infectados pelo
estreptococus A, e portanto com ASLO elevado, desenvolverão febre
reumática.
Ácido úrico
É um catabolito final das vias das purinas e quando elevado no sangue
pode depositar-se como cristais nos tecidos originando a artrite da gota. Deve
ser interpretado criticamente, de forma integrada com a avaliação clínica, pois 37
para cada caso de gota, existem 9 de hiperuricemia assintomática.
Exames complementares baseados em imagem
O papel atribuído à ultrassonografia, de rastreador de lesões mio-tendíneas em
pacientes portadores de LER/Dort, é superestimado no que tange ao diagnóstico e
ao  acompanhamento evolutivo, gerando expectativas irreais e custos
desnecessários ao sistema de atendimento à saúde. Como outros exames
complementares, os resultados ultrassonográficos também devem ser sempre
interpretados à luz do quadro clínico. O diagnóstico ultrassonográfico da
tenossinovite dos flexores e extensores dos quirodáctilos, tão emblemático e
freqüente nos pacientes com LER/Dort no final dos anos 80, é feito, atualmente, com
freqüência muito menor. No passado, a imagem de halo hipoecogênico da
disposição anatômica normal da transição mio-tendínea, com as fibras musculares
terminais que envolvem as fibras tendíneas proximais, era considerada um
espessamento da bainha sinovial. Essa interpretação equivocada de uma imagem
normal tem sido corrigida  graças ao maior poder de resolução óptica e de contraste
tecidual dos modernos equipamentos e do aperfeiçoamento técnico dos
examinadores. As lesões músculo-esqueléticas mais freqüentemente detectadas
pela ultrassonografia no punho de pacientes portadores de LER/Dort são, em ordem
decrescente: sinovite rádio-carpiana e inter-carpiana, cistos gangliônicos
artrossinoviais (comunicantes com o espaço articular) e tenossinovite estenosante
do abdutor longo do polegar (De Quervain). No cotovelo: entesopatia da origem miotendínea junto aos epicôndilos lateral e medial do úmero, e da inserção do bíceps
braquial distal na tuberosidade bicipital do rádio. No ombro: conteúdo líquido e/ou
espessamento sinovial na bolsa serosa subacromial-subdeltóidea e tendinopatia no
supraespinhal (com ou sem calcificações). A ultrassonografia é muito eficiente na
avaliação da extensão e gravidade destas lesões.
A detecção ultrassonográfica de lesões mio-tendíneas pertinentes à LER/Dort
no antebraço, no braço e na região cérvico-escapular é praticamente nula, tornando
desnecessária sua solicitação, levando-se em conta que a dor nessas regiões é
muito freqüentemente referida/reflexa às alterações articulares (punho, cotovelo e 38
ombro). Não se recomenda, ainda, a solicitação de avaliação de ambos os membros
para análise comparativa, visto que o examinador a fará se conveniente ou
necessário, evitando-se assim  a detecção de alterações ecográficas desprovidas de
significado clínico no membro contra-lateral assintomático.
A radiografia simples pode  demonstrar lesões ósteo-articulares , relacionadas
ou não às LER/Dort como a artropatia degenerativa ou  as calcificações de partes
moles nas entesopatias. Artropatia inflamatória, como a artrite reumatóide , embora
não relacionada às LER/Dort, pode, em sua fase inicial, estar incluída no diagnóstico
diferencial, com sinais radiográficos positivos.
A ressonância magnética apresenta eficácia semelhante à da ultrassonografia
na detecção de alterações mio-tendíneas e de tecidos moles nos membros
superiores, a um custo mais elevado. É, porém, mais eficiente na avaliação das
estruturas intra-articulares, que são inacessíveis ao exame ultrassonográfico. No
contexto das LER/Dort deve ser reservada à pesquisa de alteração articular de difícil
elucidação clínica, radiográfica ou ultrassonográfica.
O acompanhamento ultrassonográfico evolutivo das alterações músculoesqueléticas ligadas às LER/Dort costuma ser mais coerente e concordante com a
evolução clínica nas lesões de natureza inflamatória (sinovites) em comparação às
degenerativas (entesopatias). É muito comum haver dissociação clínico-ecográfica
nas entesopatias do cotovelo, com alterações ecográficas persistentes ou mesmo
permanentes em pacientes totalmente assintomáticos por longo tempo. Dessa
forma, o controle ecográfico evolutivo das entesopatias e tendinopatias
degenerativas, se necessário, deve ser realizado em longos intervalos de tempo,
não menos que 12 meses, tendo-se em mente a perenidade das alterações
ecográficas.
O diagnóstico das síndromes compressivas neurais é baseado em achados
clínicos e eletromiográficos. Os métodos de diagnóstico por imagem têm papel
secundário no seu diagnóstico, mas podem colaborar no planejamento terapêutico
cirúrgico ao evidenciar fatores causais como processos expansivos (tumores, cistos,
etc).
Diretrizes e sugestões:39
1. No punho, as lesões mais freqüentemente observadas à ultrassonografia são
articulares e de natureza inflamatória (sinovite no carpo). Tenossinovite dos
flexores e extensores dos quirodáctilos é muito raramente diagnosticada.
2. No cotovelo, as lesões mais freqüentemente encontradas à ultrassonografia
são de natureza degenerativa (entesopatia junto aos epicôndilos umerais).
3. No ombro, são inflamatórias (bursites) e mistas degenerativas/inflamatórias
(tendinopatias).
4. A solicitação de exame ecográfico do antebraço, braço e região cérvicoescapular é desnecessária e onerosa, assim como solicitação de avaliação
comparativa do membro contra-lateral assintomático.
5. Ultrassonografia das articulações clinicamente afetadas é o exame a ser
solicitado para rastreamento das lesões músculo-esqueléticas associadas às
LER/Dort. Radiografias convencionais e ressonância magnética devem ser
solicitadas em casos específicos.
6. Controles ecográficos evolutivos apresentam maior concordância com o
quadro clínico nas lesões inflamatórias (sinovites, bursites) em comparação
às degenerativas (entesopatias, tendinopatias). Devem ser solicitados,
quando necessários, em longos intervalos de tempo, levando-se em conta a
perenidade das alterações ecográficas nas lesões degenerativas.
7. O diagnóstico das síndromes compressivas neurais é baseado em achados
clínicos e eletromiográficos. Os métodos de diagnóstico por imagem podem
colaborar no planejamento terapêutico cirúrgico.
1.4. Rede de urgência/ emergência e pronto-atendimento
Com relativa freqüência, os pacientes com LER/Dort procuram a rede de
urgência, emergência e pronto-atendimento em crises de dor. Com diferentes
tempos de evolução geralmente insidiosa, os pacientes apresentam dores que
atingem um ou dois membros superiores, de forte intensidade e cujo controle não é
obtido por manobras habitualmente feitas, tais como uso de medicações analgésicas
ou anti-inflamatórias, compressas quentes, interrupção da atividade laboral, automassagens, manobras de alongamento e/ou relaxamento.
Após a assistência de pronto-atendimento prestada ao caso, deve ocorrer um
encaminhamento para investigação e procedimentos adequados à rede de atenção 40
básica. Os gestores devem prever que isto ocorra e desenvolver instrumentos de
referência dos pronto-atendimentos na rede básica.
1.5. Procedimentos terapêuticos
1. O tratamento não é exclusividade médica. É desejável a participação de
outros profissionais da saúde, tais como fisioterapeuta, terapeuta
ocupacional, enfermeiro, assistente social, psicólogo, profissional de terapias
complementares, terapeuta corporal com domínio de técnicas diversificadas
para se obter a efetividade no tratamento.
2. Nos casos iniciais, o tratamento pode ser menos complexo e abrangente,
porém nos casos crônicos, com múltiplas localizações, é importante se definir
um programa de tratamento, com metas.
3. Em qualquer caso, agudo ou crônico, mesmo com regressão dos sintomas, é
de fundamental importância prevenir recidivas e/ou agravamentos.
4. Os medicamentos devem ser prescritos de maneira cautelosa. Os pacientes
precisam ser bem orientados quanto à forma correta de utilização e o que
esperar deles. Além disso, é importante considerar o tempo de tratamento,
que pode ser um fator importante nos medicamentos de alto custo. Os
medicamentos analgésicos e antiinflamatórios são úteis no combate a dor
aguda e inflamação, mas, se usados isoladamente não são efetivos no
combate da dor crônica. Neste caso, é necessária a associação dos
psicotrópicos (antidepressivos tricíclicos e fenotiazínicos), que proporcionam
efeito analgésico e ansiolítico, estabilizam o humor e promovem alteração na
simbologia da dor.
5. A fisioterapia é primordial para o tratamento dos pacientes com LER/Dort,
tendo como objetivos principais: alivio de dor, relaxamento muscular e
prevenção de deformidades, proporcionando uma melhora da capacidade
funcional. Para isso irá utilizar recursos de eletrotermofototerapia,
massoterapia e cinesioterapia, sendo que a combinação de técnicas deverá
ser definida após a avaliação fisioterápica. Não é possível padronizar o tipo
nem a duração do tratamento. A presença ativa do fisioterapeuta é
fundamental para uma avaliação continua da evolução do caso e para
mudanças de técnicas ao longo do tratamento. A utilização de grupos
terapêuticos para pacientes crônicos, abordando temas como percepção 41
corporal, auto-massagem, alongamento e relaxamento, têm se mostrado
eficiente na reabilitação física destes pacientes.
6. A psicoterapia individual ou em grupo é essencial para os pacientes de
LER/Dort, para que se sintam amparados em sua insegurança e temor no que
se refere às situações de conflito no trabalho, as conseqüências do
adoecimento e as perspectivas de futuro e reinserção profissional.
7. A terapia ocupacional tem se mostrado bastante útil na conquista da
autonomia dos pacientes adoecidos por LER/Dort. As atividades relacionadas
com a vida cotidiana, lazer, trabalho, fazem com que os pacientes reapropriem suas capacidades e re-signifiquem o seu “fazer”, considerando
todas as mudanças decorrentes do adoecimento. A terapia ocupacional faz a
avaliação, indicação e confecção de órtese de posicionamento para
prevenção de deformidades.
8. As terapias complementares, como acupuntura, do-in, shiatsu, entre outras
tem se mostrado pertinentes no tratamento da LER/Dort.
9. As atividades em grupo para pacientes com LER/Dort, de caráter terapêutico
educativo, realizados nos serviços públicos de saúde por equipes
multiprofissionais, têm obtido resultados significativos permitindo a reflexão do
processo de adoecimento, discussão sobre as dúvidas, dificuldades
enfrentadas no estabelecimento do diagnóstico, tratamento, proporcionando o
estabelecimento dos limites e o resgate da cidadania.
10.  Os procedimentos cirúrgicos não têm se mostrado útil nos casos de
LER/Dort. Freqüentemente os pacientes com história relativamente longa,
submetidos a procedimentos cirúrgicos, evoluem para dor crônica de difícil
controle. 42
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