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quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

O FUTURO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS


O futuro dos direitos fundamentais.

A necessidade de sua efetivação


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O grande problema atual dos direitos fundamentais, no entendimento de Norberto Bobbio, não é mais o de fundamentá-los, mas, sim, o de protegê-los [01].
Para o jusfilósofo italiano, "o problema que temos diante de nós não é filosófico, mas jurídico e, num sentido mais amplo, político. Não se trata de saber quais e quantos são esses direitos, qual é a sua natureza e seu fundamento, se são direitos naturais ou históricos, absolutos ou relativos, mas sim qual é o modo mais seguro para garanti-los, para impedir que, apesar das solenes declarações, eles sejam continuamente violados" [02].
A observação coloca-se, no nosso entendimento, nos mesmos termos para os direitos fundamentais na ordem jurídica brasileira.
Consagrou a Constituição de 1988 um amplo rol de direitos e garantias individuais e coletivos em seu artigo 5º, além de outros dispersos em seu texto, em razão do § 2º do mesmo artigo, já reconhecidos, inclusive, pelo Supremo Tribunal Federal, como o princípio da anterioridade tributária. Trata-se, aqui, da previsão dos direitos fundamentais ditos de primeira geração, direitos subjetivos, cujo titular do poder de agir é todo e cada um dos seres humanos, que podem ser contrapostos ao Estado, preservando-se, assim, a liberdade individual desses seus titulares [03].
O artigo 5º da Constituição de 1988, já em seu caput, prescreve que "todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade", nos termos estabelecidos, agora, após a Emenda Constitucional nº45/04, pelos seus setenta e oito incisos.
Não há o que se falar, nesse caso, em ausência de previsão constitucional de algum direito humano fundamental. E, ainda que assim fosse, o § 2º do mesmo artigo garante o caráter exemplificativo do rol trazido pelo constituinte, ainda que seja tarefa difícil encontrar algum direito fundamental implícito. Demonstração do que se afirmou pode ser encontrada ao se comparar o rol dos direitos humanos de primeira geração positivados pela Constituição de 1988 e o rol apresentado pela Convenção Americana sobre Direitos Humanos, o Pacto de São José da Costa Rica: a quase totalidade dos direitos previstos nesse importante tratado internacional encontra correspondente na Constituição brasileira, com a única exceção da prisão civil por dívidas no caso do depositário infiel [04].

O parâmetro internacional que pode ser tomado com relação aos direitos econômicos e sociais é o Protocolo adicional à Convenção Americana sobre Direitos Humanos em Matéria de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, o Protocolo de San Salvador. Esse tratado internacional protege o direito ao trabalho, os direitos sindicais, o direito à previdência social, o direito à saúde, à alimentação, à educação, aos benefícios da cultura, à constituição e proteção da família, aos direitos da criança, de pessoas idosas, deficientes, sem falar ao direito a um meio ambiente sadio, direito fundamental tido de terceira geração, que também se encontra resguardado pela Constituição em seu artigo 225
 [06].Assim também é com relação aos direitos econômicos e sociais, direitos de segunda geração, que são também direitos subjetivos, assim como as liberdades públicas, mas que têm por objeto o poder de exigir do Estado determinadas prestações positivas [05]. A Constituição prevê, em seu artigo 6º, o direito à educação, à saúde, ao trabalho, à moradia, ao lazer, à segurança, à previdência social, à proteção à maternidade e à infância, à assistência aos desamparados, bem como um extenso rol de direitos dos trabalhadores, com trinta e quatro incisos, em seu artigo 7º.
Já com relação aos direitos humanos de terceira geração, os direitos de solidariedade, além do direito ao meio ambiente, já destacado acima, garante a Constituição brasileira, em seu artigo 220, o direito à comunicação e, entre os princípios regentes das relações internacionais da República Federativa do Brasil, por exemplo, o direito à paz e à autodeterminação dos povos, em seu artigo 4º, incisos III e VI.
Como se pode observar, os direitos humanos fundamentais, em suas mais diversas manifestações, recebem proteção constitucional. Não é, pois, por falta de previsão constitucional que os direitos humanos fundamentais carecem de efetivação no direito brasileiro; de maneira oposta, os direitos são excessivamente previstos na ordem constitucional, ocasionando o que Manoel Gonçalves Ferreira Filho aponta ser uma inflação dos direitos fundamentais [07].
O problema é, como observado inicialmente, de proteção e não de previsão.
Nesse sentido, uma primeira proteção aos direitos fundamentais que uma lei constitucional poderia garantir é a impossibilidade de sua retirada do texto constitucional. E isso a Constituição de 1988 faz, ainda que com uma impropriedade terminológica: o artigo 60, §4º, IV, prescreve que "não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir os direitos e garantias individuais". Sobre o dispositivo, afirma Manoel Gonçalves Ferreira Filho que "não é despropositado afirmar ser a expressão ‘direitos e garantias individuais’ equivalente a ‘direitos e garantias fundamentais’" [08].
Não basta, porém, o dispositivo. É necessário assegurar o texto constitucional contra alterações indevidas, seja por emenda constitucional, seja por legislação ordinária. Papel fundamental assume, assim, o controle de constitucionalidade na efetiva proteção dos direitos fundamentais previstos na Constituição. Emenda constitucional ou legislação infraconstitucional que contrariar preceito da Constituição garantidor de direito humano fundamental é inconstitucional, devendo ser declarada, pois, a sua nulidade [09].
São protegidos, dessa forma, os direitos humanos fundamentais positivados pela Constituição contra atos legislativos inconstitucionais. E como protegê-los contra omissões inconstitucionais? Esse é um tema bastante delicado. Em seu artigo 103, §2º, o texto constitucional previu a possibilidade de se declarar a omissão inconstitucional, no intuito de tornar efetiva norma constitucional não auto-executável.
Acontece que a sanção decorrente da declaração desse vício de inconstitucionalidade não garante a efetividade do texto constitucional, pois, "declarada a inconstitucionalidade por omissão de medida para tornar efetiva norma constitucional, será dada ciência ao Poder competente para a adoção das providências necessárias e, em se tratando de órgão administrativo, para fazê-lo em trinta dias". Assim, a única sanção decorrente da declaração da inconstitucionalidade por omissão é a simples notificação ao Poder omisso, que, se não atender ao aviso, não sofrerá sanção nenhuma.
José Afonso da Silva [10] afirma que "a mera ciência ao Poder Legislativo pode ser ineficaz, já que ele não está obrigado a legislar. Nos termos estabelecidos, o princípio da discricionariedade do legislador continua intacto, e está bem que assim seja". Mas acrescenta que "isso não impediria que a sentença que reconhecesse a omissão inconstitucional já pudesse dispor normativamente sobre a matéria, até que a omissão legislativa fosse suprida", concluindo que "com isso conciliar-se-iam o princípio político da autonomia do legislador e a exigência do efetivo cumprimento das normas constitucionais". A saída proposta por José Afonso da Silva é, de fato, tentadora, mas talvez mereça uma maior reflexão levando-se em conta o princípio da separação dos Poderes.
Outro instrumento de proteção dos direitos fundamentais previsto pela Constituição brasileira é o mandado de injunção. Por força do artigo 5º, LXXI, "conceder-se-á mandado de injunção sempre que a falta de norma regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania".
Trata-se, assim, de mais um instrumento hábil à proteção dos direitos humanos fundamentais positivados pelo texto constitucional, mas que dependa de norma regulamentadora. Acontece que, por uma dessas ironias constitucionais, mesmo esse artigo 5º, LXXI, carece de aplicabilidade e a doutrina e a jurisprudência nacional discutem quais seriam os seus efeitos. Sobre o conteúdo do dispositivo, afirma José Afonso da Silva [10] que ele "consiste na outorga direta do direito reclamado. O impetrante age na busca direta do direito constitucional em seu favor, independentemente de regulamentação".
Vê-se, assim, o papel central ocupado pelo controle de constitucionalidade na proteção dos direitos humanos fundamentais, seja contra atos, seja contra omissões inconstitucionais.
O problema brasileiro, como visto, não é a falta de previsão constitucional de direitos humanos fundamentais; o texto constitucional o faz e com abundância (o que não deixa de ser também um problema, como visto, em razão de sua inflação).
Se o futuro dos direitos fundamentais encontra-se diretamente vinculado, hoje, à sua proteção, e não mais a sua fundamentação, deve-se atentar ao sistema nacional de controle de constitucionalidade, de maneira a torná-lo mais eficaz.


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